Não há coroa sem cruz – João Calvino

13:22
1. Qualquer que seja a classe de provações que nos aflige, devemos sempre manter a vista na seguinte meta: temos de nos acostumar ao menosprezo [das vaidades] da vida presente, para que possamos meditar na vida futura.

O Senhor sabe que, por natureza, somos inclinados a amarmos este mundo de maneira cega e carnal; portanto, usa excelentes meios para nos atrair até Ele e elevar-nos de nossa negligência, de modo que nosso coração não se apegue demasiado a essa estúpida inclinação.

2. Não há, entre nós, ninguém que não lute apaixonadamente durante todo o curso de sua vida por conseguir a imortalidade celestial; nem ninguém que não trate de alcançá-la.

Realmente estamos envergonhados de não sermos melhores que os animais cuja condição, em absoluto, não seria inferior à nossa se não fosse pela esperança da eternidade depois da morte.

Porém, se examinarmos acerca dos planos e empreendimentos ambiciosos, e as ações de cada indivíduo, descobriremos que suas ambições só alcançam o nível desta terra.

Por isso, podemos nos considerar realmente estúpidos, quando permitindo que nossa mente se cegue com o esplendor das riquezas, do poder e da honra, não possa ver nada mais além destas coisas.

Também o coração angustiado e cheio de avareza, ambição e outros maus desejos, não pode elevar-se acima do nível terreno.

Em resumo, quando a alma se encontra envolta em desejos carnais, busca sua felicidade nas coisas desta terra.

3. Para resistir a esta inclinação do homem natural, o Senhor nos ensina o que é na verdade a vaidade da vida presente, por meio das varias lições mediadas pela aflição.

Para que os cristãos não se sintam cômodos com uma vida de facilidades e conforto, Deus permite que sejam freqüentemente perturbados por meio de guerras, revoluções, roubos e outras calamidades.

Para que não se apeguem com avidez às riquezas passageiras deste mundo, ou que não venham a depender somente daquilo que possuem, Ele lhes reduz à pobreza, ou limita-lhes à mediocridade, algumas vezes por meio do exílio, outras pela esterilidade da terra, às vezes pelo fogo ou qualquer outro meio.

Para que não sejam demasiado complacentes ou se deleitem em excesso com a vida matrimonial, permite que tenham algum outro desgosto, devido aos defeitos de ambos, marido e mulher, humilha-os através dos filhos, ou lhes aflige com o afã de querer deixar descendência e não poder tê-la, ou até por meio da perda de um filho.

Porém, sendo Deus tão bom e misericordioso com os Seus, por meio das enfermidades e dos perigos lhes ensina o quão inestimáveis e passageiras são as bênçãos terrenas, de maneira que não se encham de vangloria.

4. Portanto, entendamos que somente podemos colher favores da cruz quando aprendemos que esta vida, em si mesma, está cheia de dissabores, dificuldades e misérias; que não é uma vida feliz de nenhum ponto de vista, e que as suas chamadas bênçãos são incertas, passageiras e estão mescladas com um sem-fim de adversidades.

Tenhamos, pois, presente que a única coisa que podemos esperar neste mundo é uma luta contínua e atroz; elevemos então nossos olhos ao céu para vermos ali nossa coroa.

Todavia, devemos admitir que nosso coração nunca está disposto a meditar e desejar as bênçãos da vida futura, a menos que tenha aprendido conscienciosamente a deixar de lado as vaidades do mundo presente.

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Fonte: www.ocalvinismo.com