Não seja um covarde, milite a boa milícia da fé

17:47
A. W. Pink
Não seja um covarde, milite a boa milícia da fé - A. W. Pink   

   Há alguns que ensinam que os cristãos que se envolvem no combate espiritual estão vivendo abaixo de seus privilégios. Eles insistem que Deus está disposto a fazer todo o nosso combate para nós. Seu slogan de estimação é: “Deixe acontecer, e deixe Deus agir” Eles dizem que o cristão deve deixar a batalha para Cristo. Há uma meia verdade nisso, mas uma meia verdade quando levada a extremos, torna-se erro. A meia verdade é que o filho de Deus não tem a força em si mesmo, Cristo diz aos seus discípulos: “Sem Mim, nada podeis fazer” (João 15:5). No entanto, isso não significa que devemos ser meramente passivos, ou que o estado ideal na vida é simplesmente ser autômatos Galvanizados. Há também um lado positivo, ativo e agressivo na vida cristã, que apela para o exercício dos nossos maiores esforços, para o uso de todas as faculdades, uma cooperação pessoal e inteligente com Cristo.
  
   Não há pouco do que é conhecido como “a vida vitoriosa” sendo ensinado que é virtualmente uma negação da responsabilidade do cristão. É desequilibrada. Embora enfatizando um aspecto da verdade, infelizmente ignora outros aspectos igualmente necessários e importantes, a serem mantidos diante de nós. A Palavra de Deus declara que “Porque cada qual levará a sua própria carga” (Gálatas 6:5), o que significa que ele deve cumprir sua obrigação pessoal. Santos são convidados: “purifiquemo-nos de toda a imundícia da carne e do espírito” (2 Coríntios 7:1), e “guardar-se da corrupção do mundo” (Tiago 1:27). Somos exortados a “vencer o mal com o bem” (Romanos 12:21). O apóstolo Paulo declarou: “Antes subjugo o meu corpo, e o reduzo à servidão” (1 Coríntios 9:27). Assim, negar que o cristão é chamado a se envolver em uma guerra incessante contra a carne, o mundo e o diabo, é fugir diante da face de muitas evidentes Escrituras.

   Há uma dualidade muito real para a vida cristã, e cada aspecto da verdade divina é equilibrado por sua contraparte. A Piedade prática é um paradoxo misterioso, que é in- compreensível para o homem natural. O cristão é mais forte quando ele é mais fraco, mais rico quando é mais pobre, mais feliz quando mais miserável. Sendo desconhecido (1 João 3:1); contudo, ele é bem conhecido (Gálatas 4:9). Embora morrendo diariamente (1 Coríntios 15:31), Sim, mortos; no entanto, eis que ele vive (Colossenses. 3:3-4). Apesar de não ter nada, ele possui todas as coisas (2 Coríntios. 6:10). Embora perseguido, ele não está desamparado; abatido, porém não destruído. Ele é chamado a “alegrar-se com tremor” (Salmo 2:11), e é assegurado: “Bem-aventurados vós, que agora chorais” (Lucas 6:21). Embora o Senhor o leva a deitar-se em verdes pastos e o guie às águas tranquilas, ele ainda está no deserto, e “em uma terra seca e cansada, onde não há água” (Salmo 63:1). Embora sejam os seguidores do Príncipe da paz, os cristãos devem suportar “as aflições, como bom soldado de Jesus Cristo” (2 Timóteo 2:3); e embora “mais que vencedores”, eles muitas vezes são derrotados.

   “Milita a boa milícia da fé” (1 Timóteo 6:12). Somos chamados a nos envolvermos em uma guerra incessante. A vida cristã deve ser vivida no campo de batalha. Podemos não gostar disso, podemos desejar que isto não fosse assim, mas foi assim que Deus ordenou. E o nosso pior inimigo, nosso inimigo mais perigoso, é o nosso próprio eu, “o velho homem”, que quer sempre seguir seu caminho, que se rebela contra o “jugo” de Cristo, que odeia a “cruz”; este “velho homem”, que se opõe a todos os desejos do “novo homem”, que não gosta da Palavra de Deus e sempre quer substituir a palavra do homem. Mas o “eu” tem que ser “negado” (Mateus 16:24), suas paixões e concupiscências “crucificadas” (Gálatas 5:24). Contudo, isso não é de forma alguma uma tarefa fácil. É um conflito que está sempre acontecendo dentro do verdadeiro cristão. É verdade, existem momentos em que o “velho homem” finge estar dormindo ou morto, mas logo ele revive e está mais vigoroso do que nunca em oposição ao “novo homem”. Então é que o verdadeiro cristão pergunta seriamente: “Se é assim (que eu realmente sou um filho de Deus) por que eu sou assim? ” Esse era o intrigante problema de Rebeca quando “os filhos lutavam dentro dela” (Gênesis 25:22).

   Esta parábola é colocada diante de nós na Escritura acima! Será que precisamos de qualquer intérprete? O cristão não tem a chave que explica está parábola nas experiências conflitantes de sua alma? Sim, a sequência que ocorreu com a pobre Rebeca não é a mesma com você e comigo? “Ela foi perguntar ao Senhor”. Ah, seu marido não poderia resolver este mistério para ela; nenhum homem poderia, nem ela poderia repousar sobre o seu próprio entendimento e julgar e explicar isso. Não, a luta dentro dela era tão grande e feroz que ela precisava assegurar-se da garantia Divina. E Deus não a desapontou ou a deixou na escuridão. “E o Senhor lhe disse: Duas nações há no teu ventre, e dois povos se dividirão das tuas entranhas, e um povo será mais forte do que o outro povo, e o maior servirá ao menor” (Gênesis 25:23). Mas o significado de tal versículo está escondido daqueles que são, em seus próprios conceitos “sábios e prudentes”. Mas, coma bênção de Deus, isto é revelado àqueles que, sendo ensinados pelo Espírito, são levados a perceber que eles são bebês, ou seja, que discernem que são ignorantes, fracos e impo- tentes, pois é isto o que os “bebês” são.

   E quem eram as duas nações que “lutavam” dentro Rebeca? Esaú e Jacó, de quem dois países muito diferentes se originaram, a saber, Edom e Israel. Agora observem atenta- mente o que se segue: “e um povo será mais forte do que o outro”, sim, Esaú era tão forte que Jacó tinha medo dele, e fugiu de sua presença. Assim é espiritualmente, o “velho homem” é mais forte do que o “novo homem”. Como é estranho que assim seja! Será que não devemos naturalmente concluir que aquele que é “nascido do Espírito” é mais forte do que aquele que é “nascido da carne” (João 3:6)? É claro que seria naturalmente pensado assim, pois “o homem natural não compreende as coisas do Espírito de Deus” (1 Coríntios 2:14). Mas considere o assunto do ponto de vista do discernimento espiritual. Suponha que o “novo homem” fosse mais forte que o “velho homem”, e então? Assim o cristão seria autossuficiente, orgulhoso e altivo. Mas Deus, em Sua infinita sabedoria, permite que o “novo homem” em seus filhos seja mais fraco do que o “velho homem”. Por quê? Para que eles possam depender dEle. Mas uma coisa é saber disto teoricamente, e outra bem diferente é colocá-la em prática. Uma coisa é acreditar que o “novo homem” (Jacó) é mais fraco, do que o “velho homem” (Esaú, que nasceu primeiro!), e é completamente outra coisa buscar diariamente e obter de Deus a força necessária para “lutar” contra o “velho homem”. É por isso que é chamado de “bom combate da fé”, pois a fé lida com Deus.

   “Milita a boa milícia da fé” (1 Timóteo 6:12). Nossas circunstâncias são o campo de batalha. A “carne” nunca está satisfeita com as “circunstâncias” em que Deus nos coloca, mas sempre quer mudá-las, ou entrar em um outro lugar além do que estamos agora inseridos. Assim foi com o antigo Israel. As “circunstâncias” às quais Deus levou os filhos de Israel era o deserto, e eles murmuraram, e desejaram voltar ao Egito. E isso está escrito como um alerta para nós! A tendência das circunstâncias é ligar os nossos corações à terra, quando prósperos, para fazer-nos satisfeitos com as coisas; quando adversas, para nos fazer rapinar ou cobiçar as coisas que nós não temos. Nada além do exercício da verdadeira fé pode erguer nossos corações acima das circunstâncias, pois a fé olha além de todas as coisas visíveis, pelo que o coração se deleita e encontra a sua paz e alegria no Senhor (Salmo 37:4). Isso nunca é fácil para qualquer um de nós; é sempre uma luta, e somente a graça Divina (buscada diligentemente) pode nos dar a vitória. Muitas vezes falhamos; quando o fazemos, isso deve ser confessado a Deus (1 João 1:9), e deve haver um recomeço.
Nada mais que a fé pode nos permitir subir acima das “circunstâncias”, este foi o caso de dois apóstolos, que, com os pés no tronco, com costas sangrando e doendo, cantavam louvores a Deus no calabouço de Filipos; aquela fé foi vitoriosa sobre a maioria das circunstâncias desagradáveis. Quase podemos imaginar cada leitor dizendo: “Ai de mim, minha fé é tão fraca”: Ah, pondere novamente nesta palavra: “Milita a boa milícia da fé” - note-se a repetição! Não é fácil para a fé o superar as circunstâncias; não, não é. É difícil, por vezes, extremamente difícil; assim o escritor o tem encontrado ser. Mas lembre-se, um “combate” não é concluído em um momento, por um golpe; muitas vezes, o vencedor recebe muitas feridas e é gravemente ferido antes que ele finalmente conquiste seu inimigo. Então, nós temos encontrado combates e ainda encontraremos. O grande inimigo, a “carne” (o “eu”) inflige ao “novo homem” muitos golpes dolorosos, muitas quedas; mas, pela graça, continuamos a lutar. Amiúde o “novo homem” começa a vencer, por vezes, o “velho homem” parece vencer. “Porque sete vezes cairá o justo, e se levantará” (Provérbios 24:16).

   Sim, caro leitor, cada verdadeiro cristão tem um “combate” em suas mãos: o eu é o principal inimigo que tem que ser conquistado; nossas circunstâncias, o campo de batalha, onde o combate deve ser travado. E cada um de nós gostaria muito de mudar o campo de batalha. Há coisas desagradáveis que, às vezes, tentam extremamente cada um de nós, até que somos tentados a gritar com o salmista aflito: “Oh! Quem me dera asas como de pomba! Então voaria, e estaria em descanso” (Salmo 55:6). Sim, é triste dizer: o escritor tem feito a mesma coisa. Mas, quando ele está em seu juízo perfeito (espiritualmente), ele é grato por essas mesmas “circunstâncias”. Por quê? Porque elas oferecem uma oportunidade para sua fé agir e superá-las, e para nós encontrarmos a nossa paz, a nossa alegria, a nossa satisfação, não em um ambiente agradável, não em amigos agradáveis, nem mesmo na doce comunhão com os irmãos e irmãs em Cristo; mas em Deus! Ele pode satisfazer a alma. Ele nunca abandona aqueles que verdadeiramente confiam nEle. Todavia é uma luta fazer isto. Sim, uma verdadeira luta, longa e árdua. No entanto, se clamamos a Deus por ajuda, por força e determinação, Ele não nos faltará, mas nos fará “mais que vencedores” [Romanos 8:37].

   Há em cada um de nós o desejo de agir como um covarde, e fugir do campo de batalha, as nossas “circunstâncias”. Isto é o que Abraão fez (Gênesis 12:10), mas ele não ganhou nada com isso. Isto é o que fez Elias (1 Reis 19:3), e o Senhor o repreendeu por isso. E esses casos são registrados, “para nosso ensino” (Romanos 15:4), como advertência para considerarmos em nosso coração. Eles nos dizem que devemos resistir firmemente a esta inclinação para o mal, e nos atentarmos para a exortação: “Vigiai, estai firmes na fé; portai-vos [ajam] varonilmente, e fortalecei-vos” (1 Coríntios 16:13).

   “Milita a boa milícia da fé”. O Senhor não nos convida a fazer algo do qual Ele foi dispensado. Oh! Que “luta”, o Capitão de nossa salvação suportou! Veja-O lá no deserto: “quarenta dias, tentado por Satanás. E vivia entre as feras, e os anjos o serviam” (Marcos 1:13), e durante todo esse tempo sem comer (Mateus 4:2). Quão ferozmente o Diabo agrediu, e O atacou vez após vez. E o Salvador o enfrentou e o conquistou no terreno da fé, utilizando apenas a Palavra de Deus. Veja-O novamente no Getsêmani; ali a luta foi ainda mais feroz, e tão intensas eram Suas agonias que Ele suou grandes gotas de sangue. Não havia qualquer conforto da parte de seus discípulos, eles não podiam vigiar com Ele nem mesmo uma hora. No entanto, Ele triunfou nisto, no terreno da fé: “O qual, nos dias da sua carne, oferecendo, com grande clamor e lágrimas, orações e súplicas ao que o podia livrar da morte, foi ouvido quanto ao que temia” (Hebreus 5:7).

   Esses dois casos são registrados para nossa instrução, e, como sempre, a ordem é bem significativa. Elas nos ensinam como devemos militar “a boa milícia da fé”. O próprio Cristo “nos deixou um exemplo! ” [1 Pedro 2:21] E o que podemos aprender com estes incidentes solenes e sagrados? Isso: a única arma que devemos usar é a Espada do Espírito; e, a vitória só pode ser obtida em nossos joelhos: “com grande clamor e lágrimas”. O Senhor graciosamente nos capacita a agir assim. Oh! Que cada um de nós possa mais intensamente buscar a graça de militar a boa milícia da fé. Devemos ter uma feliz e pacífica comunhão no céu; mas antes de chegarmos lá, a “luta” tem de ser travada e vencida ou nunca chegaremos lá de modo algum. (2 Timóteo 4:6-8).

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Fonte: ChapelLibrary.org 
Título Original: The Fight of Faith
Tradução: OEstandarteDeCristo.com