18:14
Se nós somos amantes de Deus, nós amamos aquilo que Deus ama.

(i) Nós amamos a Palavra de Deus. Davi estimava a Palavra pela sua doçura, acima do mel (Salmo 119.103), e pelo seu valor, acima do ouro (Salmo 119.72). As linhas da Escritura são mais ricas do que minas de ouro. Nós devemos amar a Palavra apropriadamente; ela é a estrela-ímã que nos atrai para o céu, é o campo no qual a Pérola está escondida. O homem que não ama a Palavra, mas a considera de maneira excessivamente estrita e deseja que alguma porção da Bíblia fosse dela arrancada (como um adúltero desejaria fazer com o sétimo mandamento), esse não tem sequer a menor fagulha de amor em seu coração.

(ii) Nós amamos o dia de Deus. Nós não apenas guardamos um sabbath, mas nós amamos um sabbath. “Se chamares ao sabbath deleitoso” (Isaías 58.13). O sabbath é aquilo que mantém a face da religião entre nós; esse dia deve ser consagrado como glorioso ao Senhor. A casa de Deus é o palácio do grande Rei, e no sabbath ali Deus revela a Si mesmo através da treliça. Se nós amamos a Deus, nós estimamos o Seu dia sobre todos os outros dias. Toda a semana seria escura se não fosse por esse dia; nesse dia, o maná cai numa porção dobrada. Nele, de um modo especial, as comportas do céu permanecem abertas, e Deus desce numa chuva dourada. Nesse dia bendito, o Sol da justiça se levanta sobre a alma. Oh, como um coração gracioso aprecia esse dia, feito com o propósito de desfrutarmos de Deus.

(iii) Nós amamos as leis de Deus. Uma alma graciosa tem prazer na lei porque ela restringe os seus impulsos pecaminosos. O coração estaria pronto a correr descontroladamente para o pecado, se ele não tivesse alguns benditos freios postos pela lei de Deus. Aquele que ama a Deus ama a Sua lei – a lei do arrependimento, a lei do negar-se a si mesmo. Muitos dizem amar a Deus, mas odeiam as Suas leis. “Rompamos os seus laços e sacudamos de nós as suas algemas” (Salmo 2.3). Os preceitos de Deus são comparados a laços; eles amarram os homens ao seu bom comportamento; mas os ímpios acham esses laços apertados demais, portanto dizem: “Vamos rompê-los!” Eles fingem amar a Cristo como Salvador, mas O odeiam como Rei. Cristo nos fala sobre o Seu jugo (Mateus 11.29), mas os pecadores gostariam que Ele pusesse uma coroa em suas cabeças, e não um jugo em seus pescoços; que Ele fosse um estranho rei que governasse sem leis.

(iv) Nós amamos o retrato de Deus, nós amamos a Sua imagem resplandecendo nos santos. “Todo aquele que ama ao que o gerou também ama ao que dele é nascido” (1João 5.1). É possível amar um santo e, ainda assim, não amá-lo como santo; nós podemos amá-lo por alguma outra coisa, pela sua ingenuidade ou porque ele é afável e generoso. Um animal ama um homem, não porque ele é um homem, mas porque ele o alimenta e lhe dá forragem. Mas amar um santo na qualidade de santo, isso é um sinal de amor a Deus. Se nós amamos um santo por sua santidade, por possuir nele algo de Deus, então nós o amaremos nestas quatro situações:

(a) Nós amaremos um santo, embora ele seja pobre. Um homem que ama o ouro amará o ouro, mesmo que ele esteja enrolado em trapos; assim também, mesmo que um santo esteja em trapos, nós o amamos, porque há nele algo de Cristo.

(b) Nós amaremos um santo, embora ele tenha muitas falhas pessoais. Não há perfeição aqui. Em alguns, prevalece a ira impulsiva; em outros, a inconstância; e em outros, excessivo amor pelo mundo. Um santo nesta vida é como o ouro ainda em minério, muita escória de fraqueza está agarrada a ele; ainda assim, nós o amamos pela graça que nele está. Um santo é como um belo rosto com uma cicatriz: nós amamos a bela face da santidade, embora nela haja uma cicatriz. A melhor esmeralda tem as suas manchas, as estrelas mais brilhantes têm as suas cintilações, e o melhor dos santos tem as suas falhas. Você que é incapaz de amar alguém por causa de suas fraquezas, como poderia Deus amá-lo?

(c) Nós amaremos os santos, embora, em algumas coisas menores, eles discordem de nós. Talvez um outro cristão não tenha tanta luz quanto você, e isso possa fazê-lo errar em algumas coisas; você irá rapidamente desprezá-lo porque ele não pode ainda vir para a sua luz? Onde há união no essencial, deve haver união nas afeições.

(d) Nós amaremos os santos, embora eles sejam perseguidos. Nós amamos o metal precioso, mesmo que ele esteja na fornalha. São Paulo carregou em seu corpo as marcas do Senhor Jesus (Gálatas 6.17). Aquelas marcas eram, como as cicatrizes do soldado, honoráveis. Nós devemos amar um santo tanto nas cadeias quanto nos palácios. Se nós amamos a Cristo, nós amamos os Seus membros perseguidos.

Se nisso consiste o amor a Deus, em amarmos a Sua imagem brilhando nos santos, oh, então quão poucos amantes de Deus podem ser encontrados! Acaso amam a Deus aqueles que odeiam os que são semelhantes a Deus? Acaso amam a pessoa de Cristto aqueles que estão cheios de um espírito de vingança contra o Seu povo? Como se pode dizer que uma mulher ama o seu marido, se ela rasga o seu retrato? Certamente, Judas e Juliano [1] ainda não estão mortos, o seu espírito ainda vive no mundo. Quem é considerado culpado, senão os inocentes?! Que crime é pior do que a santidade, se o diabo está entre os jurados?! Os homens ímpios parecem ter grande reverência pelos santos do passado; eles canonizam os santos mortos, mas perseguem os vivos. Em vão os homens professam o credo, e dizem ao mundo que amam a Deus, quando eles abominam um dos artigos do credo, qual seja, a comunhão dos santos. Certamente, não há um maior sinal de que um homem está pronto para ir ao inferno do que este: não apenas carecer da graça, mas também odiá-la.

[1] Provavelmente, uma referência ao imperador romano Juliano, conhecido como “o Apóstata”.

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FONTE: voltemosaoevangelho.com

21:06
John Bunyan
SOBRE O PECADO

Nenhum pecado contra Deus pode ser considerado pequeno porque é sempre um acto contra o Criador do Céu e da Terra. Mas se um pecador consegue, na sua imaginação, inventar um deus menor, logo se entrega a pecados menores também.

 Pecado é o grande mal e arma de bloqueio para toda a nossa felicidade, é a razão para toda a miséria de todo o homem, tanto aqui quanto depois. Retire-se todo o pecado da vida do homem e nada mais o poderá ferir, pois a morte espiritual, a morte carnal e a morte eterna são seu único salário.

 Pecado e o homem para o pecado, serão sempre os únicos objectos da ira de Deus. Que dramático deve ser o caso de quem permanece em pecado! Quem pode suportar um pouco da ira bem acesa de Deus!

Qualquer pecado torna a graça de Deus em uma coisa opaca e sem valor. É a única coisa que desafia toda a Sua justiça eterna, viola toda a Sua misericórdia, esgota toda a Sua paciência, mina todo o Seu poder nas nossas vidas e desfaz todo o Seu amor por nós.

Tenha sempre o cuidado de nunca dar-se a liberdade de pecar, pois um pecado leva sempre ao outro. Depois, logo chega ao ponto de ser costume doentio, chegando mesmo a ser natural pecar.

Começar a pecar, é colocar um alicerce para uma continuidade de qualquer pecado. Este continuar é a única mãe do costume de pecar e a consequente falta de pudor a grande tragédia que lhe irá seguir.

 Aquela Morte de Cristo permite-nos a maior de todas as descobertas sobre nós mesmos, das condições em que fomos achados e de como nada nos poderia valer senão a Sua Morte por nós e, também, a descoberta mais clarividente sobre a terrível façanha (audácia) que é o nosso pecado. Como a sua natureza fez perecer o próprio Criador do mundo! Se o pecado é, de facto, coisa tão medonha e horrível, que chegou a trespassar o lado e coração do Filho do Homem, como pode um pecador ainda suportar os seus pecados?

SOBRE O ARREPENDIMENTO E O VIR PARA CRISTO

O fim de toda a aflição é a descoberta dos nossos pecados, desde que nos levem aos pés do Salvador. Vamos então, como o filho pródigo, voltar ao nosso Pai. Logo acharemos paz e descanso para a nossa alma.

Alguém neste mundo inteiro que seja considerado o pior de todos os pecadores, pode, pela graça na penitência do arrependimento, tornar-se tão bom quanto os melhores.

Ser verdadeiramente sensível à proximidade do pecado, é estar triste porque se fere profundamente o nosso Deus e Criador. Somos mais afligidos por nós mesmos porque O estamos a magoar, do que por Ele.
 
As tuas intenções quando te arrependes, tanto quanto a negligência em desfavor da tua própria salvação, serão sempre um marco e um atestado contra ti no Juízo Final!

Qualquer arrependimento real e honesto, carrega consigo uma retórica divina, a qual persuade Cristo a perdoar montanhas de pecados cometidos contra Ele.

Nunca diga a si mesmo que amanhã se arrependerá, pois é seu dever fazê-lo hoje.

 O evangelho da graça de Cristo e da Sua salvação, estará sempre acima de todas as outras doutrinas, mas não deixa de ser a mais perigosa de todas caso seja recebida por homens desprovidos dessa mesma graça. Se esta não for sustentada com uma necessidade absoluta de um Salvador real, nunca é graça. A tais homens e mulheres que têm apenas a noção de tudo aquilo que é esta graça de Deus, digo que serão sempre os mais miseráveis e execráveis de toda a raça humana. Porque sabem através da sua razão muito mais que os pagãos da terra, esta será a sua única porção: no fim apanharão com mais açoites que todos.

SOBRE O ORAR

Antes de entrares em teu quarto para orar, pergunta a ti mesmo esta pergunta: Para quê, com que finalidade, minha alma, entras aqui para este santo lugar? Vieste para aqui para ter uma conversa com Ele? Estará Ele presente também? É teu pesar leve, teu pensamento leviano? Não estás a lidar com a saúde de todo teu espírito? Que palavras irás usar para que Ele considere ter misericórdia de ti?

Para que a tua preparação para este solene momento seja completa, considera-te nada menos que pó e cinzas de pecado e que Ele, o grandioso Pai do nosso Senhor Jesus Cristo, se veste com luz inigualável, como se dum manto se tratasse. Que és um vil pecador, Ele um Deus sem mácula; que és pouco mais que um verme rastejante, Ele seu Omnipotente Criador.

Em todas as tuas solenes orações, nunca te esqueças de Lhe ser agradecido pelas Suas muitas e grandes misericórdias.

Quando, então orares, é preferível que teu coração deixe de ter palavras, do que tuas palavras deixem de ter coração.

A tua oração eliminará o teu pecado por completo, pondo-lhe fim, ou então o teu pecado dará um fim à tua oração.

O Espírito de oração é mais precioso que muitos tesouros de ouro e de prata.

Ora muito, quantas vezes desejares, pois tua oração é um escudo real, um cheiro suave e uma afronta a Satanás

SOBRE O AMOR AO MUNDO

Nada tem como impedir uma alma de se poder aproximar de Cristo, com excepção dum amor fútil pelas coisas que o mundo oferece. E até que uma alma esteja inteiramente liberta de tal monstruosidade, nunca poderá ter nela mesma um grande amor por Deus.

Que serão as honras e as iguarias das riquezas neste mundo comparando-as com as riquezas que obteremos de Cristo juntamente com a coroa da Vida?

Nunca ames o mundo, pois o amor ao mundo é uma lagarta roedoura de toda a vida com Cristo.

Desprezar o mundo é o caminho para o Céu brilhar em nós. E bem-aventurados serão todos aqueles que conseguem ter uma conversa a sós com Deus.

Que tolice maior poderá existir que trabalhar pela carne que apodrece, negligenciando com isso o maná da Vida Eterna?

Ou Deus ou o mundo - um dos dois terá necessariamente de sair desprezado em uma vida e quando esta se desvanece no leito da sua morte, esse será o seu grande teste.

Buscando a tua vida, a ti mesmo neste mundo, teu próprio interesse, é estar perdido para sempre. E ser humilde é exaltação excelente.

Todo aquele que se deleita com as realezas deste grande mundo, pensa muito pouco, pois um dia quem admirou, será testemunha veloz contra ele.

SOBRE A AFLIÇÃO

Nada tem como tornar a aflição tão insuportável como uma montanha de pecados: para que possa estar apto a suportá-la, assegure-se que depõe todo pecado e sejam quais forem as aflições que lhe venham atormentar, qualquer montanha lhe será coisa facílima de transpor.

O Senhor tem como usar a dor da tribulação para ter como separar o trigo da palha que carregou o trigo até ali.

Se por acaso você tem como suportar a vara da aflição, a que foi Deus que impôs sobre si, lembre-se sempre desta verdade: você apanha para que melhore de coração.

A escola da Cruz é a escola da luz; ela descobre a vaidade de ser do mundo, expondo-a, desmascara a sua vil forma de ser, a sua impiedade profunda e permite-nos ver mais e melhor a mente de Deus. Desde as trevas da aflição nos pode chegar luz miraculosíssima!

É naqueles momentos de maior aflição que desvendamos muitas coisas acerca do real amor de Deus.

Será que de coração acabamos por renunciar todos os prazeres deste vil mundo? Então, pouco temos a temer sobre a aflição, pois nunca nos fará tropeçar. O que torna um certo estado de aflição mesmo insuportável, serão tão só os prazeres desta vida mundana, a qual não tem como suportar a possibilidade de nos separarmos dela de facto.

SOBRE O SOFRIMENTO

Não será qualquer tipo de sofrimento que faz um mártir, mas apenas o sofrer porque se é verdadeiro e se está em plena conformidade com a Palavra de Deus. Isto é, não apenas sofrer de forma justa, mas pela justiça; não apenas pela verdade, mas por amor à verdade; nunca apenas pela palavra de Deus, mas de acordo com ela: dar testemunho, com aquela santidade, humildade, no mesmo espírito de mansidão que a própria Palavra de Deus requer de nós.

É coisa muito rara sofrermos pelos motivos certos e mantendo o espírito vergado apenas a Deus contra o Seu inimigo: o pecado; pecado em doutrina, em adoração, pecado na vida e em qualquer tipo de conversação.

Não será o diabo, nem os homens deste mundo que conseguirão extinguir a justiça de dentro de ti, ou o amor por ela - apenas a tua própria mão. Só se separa essa justiça de ti pela tua própria actuação. Aquele que sofre em prol de ser justo, ou por um amor completo à justiça interior, não tem como ser tentado a trocar essa justiça por alguma outra coisa, porque o bem-estar do mundo dependem dela.

Sempre pensei que a nata dos Crentes são feitos na pior das eras: quanto pior for o momento, maior e melhor será o Crente. E continuo a pensar que uma das razões porque não somos tornados melhores, será porque Deus já não nos purga e não nos prova como fazia. Noé e Lot, quem era mais santo que eles durante os tempos das suas aflições? E quem haverá mais vil e mais fútil do que o que está em sua prosperidade?

SOBRE A MORTE E O JUÍZO

Tal como o diabo opera por todos os meios para nos manter fora de todas as coisas boas, do mesmo modo opera para afastar dos pensamentos, tanto quanto pode, tudo sobre uma vida noutro mundo após a morte. Ele bem sabe que se mantiver os homens afastados de pensar na morte, eles se sentirão mais à vontade para pecar.

Nada nos tornará mais sérios naquele labor de operar a nossa própria salvação, do que uma frequente meditação sobre a morte. Nada terá maior influência sobre os nossos corações, de nos retirar das futilidades e, ao mesmo tempo, inspirar a nascença de desejos sobre a santidade.

Ó pecador, em que condição te acharás caído quando abandonares este mundo? Se partires sem estares convertido, teria sido melhor haveres sido esmagado assim que nasceste. Teria sido melhor haverem-te puxado dum lado e do outro e seres dividido em duas partes; melhor te seria haveres nascido cachorro, uma serpente, uma rã, do que nasceres homem e morreres sem te converteres e me darás toda a razão quando lá chegares sem te haveres arrependido.
 
Um homem seria tido como tolo caso se atrevesse a desafiar e a tratar mal um Juiz antes de ser julgado por ele. E o Juízo de Deus terá tanto mais peso que um desses, pois dele dependerá toda a nossa felicidade e miséria eternas; e mesmo assim atrevemo-nos a desafiá-Lo e afrontá-Lo com nossos pecados?

A única maneira de escaparmos daquele Juízo horrível, é passarmos certas sentenças de juízo sobre nós corretamente enquanto estivermos aqui na terra. Assim que soar aquela última trombeta, a qual convocará os mortos para comparecerem diante do trono de Deus para serem julgados, os justos se apressarão a sair de suas sepulturas com alegria, para se encontrarem com o seu Redentor nas nuvens. Mas, os outros clamarão às montanhas para que caiam sobre eles, para os encobrir da vista daquele Juiz feroz! Vamos, então, pousar no tempo que nos resta e decidir para qual dos dois lados queremos ir.

SOBRE AS ALEGRIAS DOS CÉUS

Nada existe de bom neste mundo com excepção do que já está contaminado e misturado com o mau. As honras têm surpresas desagradáveis, a riqueza tem insensatez e todos os prazeres arruínam a saúde. Mas, apenas nos céus acharemos bênçãos sem igual, de tal modo puras que nada terão que as possam fazer amargar e tendo tudo nelas para as tornar incomparavelmente doces.

Quem neste mundo poderá conceber as inexprimíveis, inconcebíveis alegrias que se acharão lá? Apenas aqueles que já as experimentaram cá. Senhor, ajuda-nos a dar tal valor a elas, que nos possamos preparar para as receber e tenhamos porque nos alegrar com a perda sumária de todos os prazeres inerentes à ilusão dos apetites daqui.

Como os céus transbordarão e ecoarão de alegria assim que lá chegar a noiva, a Esposa do Noivo, para ir viver com Ele para sempre!

Cristo é o supremo desejo das nações, a alegria dos anjos e o deleite do Pai; quão grande deve ser a consolação da alma que O possuir pela eternidade fora!

Ó! Quantas aclamações se verão quando todos os muitos Filhos de Deus se encontrarem em conjunto, sem nada mais para temer, sem as perturbação dos descendentes do anticristo e dos Cainistas!

Não chegará o tempo quando os piedosos poderão perguntar aos ímpios quais os proveitos que adquiriram dos seus prazeres? Qual conforto da sua grandeza? E que frutos trouxeram todos os seus labores?

Se você tiver muita curiosidade para saber tudo sobre a verdadeira essência da visão celestial, minha resposta para si será apenas que viva uma vida santa e chegue-se bem perto para ver!

SOBRE OS TORMENTOS NO INFERNO

Os céus e a salvação não foram mais prometidos a todos os que são castos do que o inferno e a condenação aos que são ímpios e será seguramente uma sentença executada sobre todos.

Assim que uma alma for condenada, pode, logo ali, dizer adeus para sempre a todo conforto e prazer.

Quem conhecerá todo o poder da ira de Deus? Ninguém com excepção dos que forem condenados!

A única companhia de todos os pecadores, será o diabo e seus demónios, para sempre atormentados sob uma maldição.

O inferno seria um género de paraíso, caso não fosse pior que o pior dos lugares deste mundo!

Tão distinto quanto será a dor da alegria, o tormento do descanso de alma e o terror da paz, essa será a distancia entre os pecadores e os santos no mundo vindouro.

SOBRE O DIA DO SENHOR, SERMÕES E DIAS DA SEMANA

Tenha zelo em santificar o dia do Senhor, pois do modo que o guardar ou usar, desse modo será guardada a sua alma durante a semana.

Torne o dia do Senhor o dia do mercado para sua alma. Que passe o dia inteiro em orações, súplicas, revisões e meditações. Coloque de parte os assuntos do resto da semana. Que o sermão que ouviu seja ponderado e traduzido em oração: irá o Senhor te oferecer estes seis dias e tu não lhe dedicarás um por inteiro?

Dentro da sua igreja seja cuidadoso em servir Deus. Ali está sob os olhares de Deus e não dos olhares dos homens.

Pode ouvir muitos sermões com muita frequência e pode mesmo ser ouvinte que pratica o que ouviu. Mas nunca pode esperar que lhe seja explicado a partir do púlpito tudo aquilo que é sua obrigação fazer. Antes seja também um estudioso afectivo da Palavra e leia bons livros. Aquilo que ouviu pode vir a ser esquecido, mas tudo quanto aprendeu, será retido e guardado com maior facilidade.

Nunca negue a adoração pública de Deus, pois Deus pode vir a negá-lo a si também, tanto em público como em privado.

Durante os dias da semana, sempre que acorda, considere isto:

    Você morrerá em breve;
    Você pode morrer naquele preciso momento;
    Que irá então acontecer à sua alma.
    Ore bastante.

Mas à noite considere isto:

    Se cometeu pecados;
    Com qual frequência orou durante o dia;
    Em quais coisas sua mente vagueou durante todo dia. Em que pensou durante o dia;
    Quais foram os seus afazeres;
    Qual foi a sua conversação;
    Se conseguir trazer à sua atenção todos os erros que cometeu durante todo o dia, nunca se atreva a adormecer sem os haver confessado a Deus e obter a esperança proveniente de um perdão real. Assim, cada noite e cada manhã faça os seus cálculos em conjunto com o Deus Todo-Poderoso e todas as suas dívidas, por fim, diminuirão drasticamente.

    JOHN BUNYAN, 10 DE SETEMBRO DE 1688

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FONTE: www.reavivamentos.com

16:31
John Flavel
Se a morte de Cristo foi aquilo que satisfez a Deus em favor de nossos pecados, existe uma infinita malignidade no pecado, visto que ele não pôde ser expiado de outro modo, senão por meio de uma satisfação infinita. Os tolos zombam do pecado, e existem poucas pessoas no mundo que se mostram verdadeiramente sensíveis a respeito de sua malignidade. No entanto, é certo que, se Deus exigisse de você a penalidade completa, os sofrimentos eternos não seriam capazes de expiar a malignidade que se encontra em um só pensamento pecaminoso. Talvez você pense que é muito severo o fato de que Deus sujeitaria as suas criaturas aos sofrimentos eternos por causa do pecado e nunca mais ficaria satisfeito com elas.

Quando, porém, você considerar bem a verdade de que o Ser contra o qual você peca é o Deus infinitamente bendito e meditar em como Ele agiu em relação aos anjos que caíram, você mudará de idéia. Oh! Que malignidade profunda existe no pecado! Se você deseja entender quão grave e horrível é o pecado, avalie seus próprios pensamentos, quer à luz da infinita santidade e excelência de Deus, que é ofendido pelo pecado; quer à luz dos sofrimentos de Cristo, que morreu para oferecer satisfação pelo pecado. Então, você obterá compreensões profundas a respeito da gravidade do pecado.

Se a morte de Cristo satisfez a Deus e, conseqüentemente, nos redimiu da maldição do pecado, a redenção de nossa alma é caríssima. As almas são preciosas e muito valiosas diante de Deus. “Sabendo que não foi mediante coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes resgatados do vosso fútil procedimento que vossos pais vos legaram, mas pelo precioso sangue, como de cordeiro sem defeito e sem mácula, o sangue de Cristo” (1 Pe 1.18-19). Somente o sangue de Deus é um equivalente para a redenção de nossa alma. Ouro e prata podem redimir-nos da servidão humana, mas não podem livrar-nos da prisão do inferno. Toda a criação não vale a redenção de uma única alma. As almas são muito preciosas; Aquele que pagou o preço da redenção delas pensou nisso. Mas os pecadores vendem por um valor muito baixo as suas próprias almas. Se a morte de Cristo satisfez a Deus no que diz respeito aos nossos pecados, quão incomparável é o amor de Deus para com pobres pecadores! Se Cristo, por meio de sua morte, consumou uma plena satisfação pelo pecado, Deus pode perdoar com segurança o maior dos pecadores que crer em Jesus.

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FONTE: www.editorafiel.com.br

00:29

Paulo, chamado para ser apóstolo de Jesus Cristo pela vontade de Deus, e o irmão  Sóstenes, à  igreja de  Deus  que  está  em  Corinto,  aos  santificados  em Cristo Jesus, chamados para serem santos, com todos os que em todo lugar invocam o nome de nosso Senhor Jesus Cristo, Senhor deles e nosso: Graça seja convosco, e paz, da parte de Deus nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo. Sempre dou graças a Deus por vós, pela graça de Deus que vos foi dada em Cristo Jesus; porque em tudo fostes enriquecidos nele, em toda palavra e em todo o conhecimento, assim como o testemunho de Cristo foi confirmado entre vós;  de  maneira que nenhum dom vos falta, enquanto aguardais a manifestação de nosso Senhor Jesus Cristo, o qual também vos confirmará até o fim, para serdes irrepreensíveis no dia de nosso Senhor Jesus Cristo. Fiel é Deus, pelo qual fostes chamados para a comunhão de seu Filho Jesus Cristo nosso Senhor. Rogo-vos, irmãos, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo, que sejais concordes no falar, e que não haja dissensões entre vós; antes sejais unidos no mesmo pensamento e no mesmo parecer. Pois a respeito de vós, irmãos meus, fui informado pelos da família de Cloé que há contendas entre vós. Quero dizer com isto, que cada um de vós diz: Eu sou de Paulo; ou, Eu de Apolo; ou Eu sou de Cefas; ou, Eu de Cristo. Será que Cristo está dividido? Foi Paulo crucificado  por  amor  de  vós?  Ou  fostes  vós  batizados  em  nome  de Paulo? Dou graças a Deus que a nenhum de vós batizei, senão a Crispo e a Gaio; para que ninguém diga que fostes batizados em meu nome. É verdade, batizei também a família de Estéfanas, além destes, não sei se batizei algum outro. Porque Cristo não me enviou para batizar, mas para pregar o evangelho; não  em  sabedoria de palavras,  para  não  se  tornar  vã  a  cruz  de  Cristo.  (I Corintios 1:1-17)

Quando  lemos  os  primeiros  capítulos  da  carta  aos  Corintios, encontramos uma imagem ambígua da igreja. Não poderia ser de outra maneira: o que o apóstolo descreve é a igreja real, com suas contradições e paradoxos. Há uma tensão entre o que a igreja aspira ser e o que a igreja é na realidade. Há uma distância entre o que a igreja é agora e o que chegará a ser  algum  dia.  A  igreja em Corinto não escapava desta ambigüidade, como se torna evidente desde os primeiros versículos da carta.

A saudação de Paulo: A ambivalência da igreja

Paulo, chamado para ser apóstolo de Jesus Cristo pela vontade de Deus, e o irmão  Sóstenes, à  igreja  de  Deus  que  está  em  Corinto,  aos  santificados  em Cristo Jesus, chamados para serem santos, com todos os que em todo lugar invocam o nome de nosso Senhor Jesus Cristo, Senhor deles e nosso: Graça seja convosco, e paz, da parte de Deus nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo. (I Corintios 1:1-3)

A  carta  começa,  como  era  costume  então,  com  a  apresentação  e  a  saudação  de  quem escreve. Paulo se apresenta primeiro a si mesmo como o escritor da carta e logo apresenta e  saúda  aos  corintios, os destinatários da  carta. Finalmente, o apóstolo apresenta  sua mensagem,  resumindo  em  seu  desejo  para  os  corintios:  graça  e  paz  de  Deus  e  nosso Senhor Jesus Cristo.

Em nove das treze introduções das suas cartas, Paulo se apresenta como apóstolo de Cristo pela vontade  de  Deus  ou  por  mandamento  de  Deus.  Na  saudação  inicial  desta carta, ainda que Paulo inclua Sóstenes na sua saudação à igreja, só aplica a si mesmo o título de “apóstolo de Jesus Cristo”, enquanto que a Sóstenes o chama de irmão.

Há muita confusão na igreja atual sobre a palavra “apóstolo”. No Novo Testamento este termo é usado em três sentidos. Em somente um versículo se aplica a todos os crentes, em João 13:16, onde Jesus disse que aquele que é enviado não é maior do que quem o enviou.  A  palavra  “enviado”  é traduzida do  grego  apóstolo.  Jesus  declara  que os cristãos estão  comprometidos  com  a  missão  apostólica  da  igreja  no  mundo.  Nesse  sentido  geral, todo cristão é um apóstolo.

O segundo uso da palavra  se aplica  aos  cristãos  como  enviados  da  igreja.  Em  II Corintios  8:23 e em Filipenses 2:25, Paulo descreve  a  Epafrodito  como  seu  apóstolo  ou enviado.  Os  “apóstolos da  igreja”  no  Novo  Testamento  eram  o  que  hoje  chamamos missionários, mensageiros do evangelho enviados para uma igreja em particular com uma missão específica.

O  uso  mais  freqüente  do  termo  “apóstolo”  no  Novo  Testamento  é  no  seu  sentido restrito, aplicado aos doze apóstolos de Jesus. A este grupo reduzido se somou o apóstolo Paulo, provavelmente Tiago e talvez mais alguns. Não eram apóstolos da igreja, mas sim apóstolos de Cristo, mensageiros que Ele havia elegido e chamado.

Paulo, igualmente aos doze, recebeu este chamado de Jesus Cristo de forma direta e pessoal.  Como eles,  também  era  testemunho  da  ressurreição.  É  certo  que  não  havia conhecido  Jesus  Cristo em  sua  existência  terrena;  tão  pouco  teve  o  enorme  privilégio  de passar  esses  três  anos formativos  com  os  discípulos  de  Jesus.  No  entanto,  o  Cristo ressuscitado lhe apareceu pessoalmente; sem essa experiência da ressurreição de Cristo, Paulo não poderia ter sido um apóstolo.

Paulo se refere aos seus antecedentes como apóstolo no capítulo 9 da mesma carta aos  Corintios,  e reitera  o  mesmo  conceito  no  capítulo  15,  ao  enumerar  as  aparições  de Jesus depois da ressurreição. Em 15:8, disse: “Por último, como a um abortivo, apareceu a mim”.  Ainda  que  se trata  de  uma  aparição  peculiar  de  Cristo,  posteriormente  a  sua ascensão, Paulo reclama a validez desta circunstância para respaldar seu nome na lista dos apóstolos.

Podemos  dizer  com  toda  firmeza  que  na  atualidade  não  há  na  igreja  apóstolos  de Jesus Cristo,  porque  ninguém  teve  uma  aparição  do  Cristo  ressuscitado.  Existem  líderes, bispos, evangelistas,  pioneiros,  missionários  e  plantadores  de  igrejas  aos  quais  podemos nos referir como ministros apostólicos. É válido dar-lhes o qualificativo “apóstolo” (adjetivo), porem  não  lhes corresponde  o  título  de  “apóstolo”  (substantivo).  Há  uma  diferença fundamental entre aqueles primeiros apóstolos e qualquer mensageiro do evangelho que os tem sucedido.

A  igreja  primitiva  compreendeu  muito  bem  esta  diferença.  Quando  morreu  o  último apóstolo, a  igreja  sabia  que  se  iniciava  uma  etapa  nova,  a  era  pos-apostólica. Uma das melhores evidencias  disto  é  o  testemunho  do  bispo  Ignácio  da  Síria,  a  quem  os  eruditos localizam  ao redor  de  110  DC,  quando  já  tinham  morrido  os  apóstolos.  Ignácio  foi condenado a morte por ser cristão e ia a caminho de Roma, fazia seu martírio. Durante a travessia, escreveu uma série de cartas às igrejas, algumas das quais chegaram ate nós. Nelas Ignácio repete com freqüência este conceito: “Não lhes dou ordem ou mandamento como fizeram Pedro e Paulo, porque eu não sou apóstolo para condenar os homens”. Ainda que era bispo, Ignácio enfatizava que não era apóstolo nem tinha a mesma autoridade que eles. É de se esperar que nós entendamos este conceito com a mesma claridade.

Se  houvesse  hoje  pessoas  com  a  mesma  autoridade  que  aqueles  primeiros apóstolos, deveríamos  agregar  seus  ensinamentos  ao  novo  Testamento  e  toda  a  igreja estaria comprometida a os aceitar e obedecer. Porem ninguém tem a autoridade comparável à  dos  doze  e Paulo.  Devemos  distinguir  entre  os  apóstolos  da  igreja,  dos  quais  existem muitos ao redor do mundo hoje, e aqueles apóstolos de Cristo.

A igreja pertence ao mesmo tempo ao céu e a terra

Paulo escreve “à igreja de Deus que está em Corinto”. Quando escreve aos tessalonicenses saúda “à igreja dos tessalonicenses em Deus”. Ambas descrições são verdadeiras. A igreja vive  tanto “em Deus”  com  “no  mundo”,  ainda  que  tenha  se  tornado  muito  difícil  manter  o equilíbrio.  Houve uma  época  em  que  a  igreja  se  apartou  totalmente  do  mundo.  Com  a pretensão de estar só em Deus, se isolou em um ambiente nostálgico. Em outras ocasiões, os cristãos cometem o erro oposto e se comprometem a tal ponto com o secular que perdem a identidade única que teen de estar ou pertencer a Deus.

A  igreja  não  foi  chamada  nem  para  se  excluir  nem  para  se  assemelhar  totalmente com o mundo. Não temos liberdade para nos retirarmos do mundo, nem tão pouco para nos confundirmos com ele. Nas palavras de Jesus, devemos estar no mundo porem não sermos parte do mundo. Precisamos lembrar continuamente que a igreja pertence a dois âmbitos: ao céu e a terra.

A igreja é santa e está em processo de santificação

A igreja tem dois estados em relação com a santidade; um é atual e o outro potencial. Por um lado, os cristãos já são santos, no sentido de ter sido separado para Deus. Por outro lado, são chamados para ser santos, a desenvolver uma vida de santidade.

Neste  sentido,  a  igreja  se  parece  muito  ao  antigo  povo  de  Israel.  No  Antigo Testamento, uma e outra vez se nomeia Israel como nação santa. Era a nação escolhida por Deus. No entanto, não era uma nação de pessoas santas senão mais bem ao contrário. Por isso, Deus constantemente os instava a voltar-se a Ele e a serem santos. A igreja hoje tem a mesma ambigüidade: já é santa e, ao mesmo tempo, Deus a chama para ser santa.

A igreja invoca a Deus e é chamada por Ele

Há uma  reciprocidade  nestes  chamados,  que  poderíamos  denominar  de  “objetivo”  e “subjetivo”. Primeiro Deus nos chama para ser santos e logo nos chama a Ele para que nos faça santos. Somente quando invocamos a Deus para que Ele realmente seja Deus em nós, temos esperança de chegar a ser o que realmente devemos ser.

Podemos dizer da igreja o que John Newton dizia de si mesmo. Havia sido traficante de escravos e logo que se converteu chegou a ser pastor e escritor de hinos, um dos quais é o tão conhecido “Maravilhosa graça”. Newton dizia: “Não sou o que devo ser, não sou o que quero ser, não sou o que um dia espero ser; mas graças a Deus não sou o que fui antes, e é pela graça de Deus que sou o que sou”. Essa é a realidade do “já” mas “ainda não” na vida individual do cristão, e é a verdade da igreja também.

A  igreja  é  o  povo  santo  de  Deus,  foi  comprada  pelo  sangue  precioso  de  Cristo  e santificada pelo Espírito Santo. No entanto, Cristo ainda não apresentou diante do trono sua noiva sem manchas nem rugas. Há uma tensão inevitável entre a realidade essencial e a realidade  atual, entre o humano e  o  divino,  entre  o  “já”  e  o  “ainda  não”.  Para  manter  o equilíbrio  é  fundamental  recordar que  vivemos  entre  dois  momentos  chaves  na  história: entre  a  primeira  e  a  segunda  vinda  de Cristo.  A  história  da  igreja  transcorre  entre  o  que Cristo fez quando veio e o que fará quando vier outra vez, entre o “já” do Reino inaugurado e o “ainda não” do Reino consumado.

Esta tensão entre a igreja real e ideal se vive muito especialmente em relação com a unidade da igreja. Em um sentido, há só uma igreja, a igreja de Deus, Sua igreja universal. No  entanto,  a  igreja cristã  ainda  não  é  uma,  e  mais  bem  se  encontra  dividida.  Essa  é  a realidade, e devemos aprender a viver nela, ao mesmo tempo em que aceitamos a unidade essencial da igreja de Cristo.


Ação de graças: A identidade da igreja

Sempre dou graças a Deus por vós, pela graça de Deus que vos foi dada em Cristo Jesus; porque em tudo fostes enriquecidos nele, em toda palavra e em todo o conhecimento, assim como o testemunho de Cristo foi confirmado entre vós;  de  maneira  que  nenhum  dom  vos  falta,  enquanto  aguardais a manifestação de nosso Senhor Jesus Cristo, o qual também vos confirmará até o fim, para serdes irrepreensíveis no dia de nosso Senhor Jesus Cristo. Fiel é Deus, pelo qual fostes chamados para a comunhão de seu Filho Jesus Cristo nosso Senhor. (I Corintios 1:4-9) Antes de admoestar ou criticar a igreja por sua desunião, sua imoralidade, seus litígios, sua má conduta na Ceia do Senhor... Paulo da graças por eles, com toda sinceridade, porque sabe que Deus está operando neles.

É sempre melhor ressaltar o positivo antes do negativo, e dar graças pelo bom antes de começar a corrigir ou criticar. Paulo da graças tanto pelo que a igreja já é como pelo que um dia chegará a ser; dá graças as Deus pela graça presente e também pela glória futura da igreja. O  apóstolo  harmoniza a  ambigüidade  da  igreja  porque  sua  perspectiva  combina passado, presente e futuro dos crentes.

O passado se expressa na graça que foi dada aos corintios em Cristo Jesus. Por Ele foram enriquecidos  em  toda  palavra  e  conhecimento,  tanto  para  a  salvação  como  para  o serviço. O “conhecimento” (gnosis) é neste caso o conhecimento recebido pela iluminação divina.  Em  outras palavras,  os  corintios  crentes  tinham  sido  capacitados  para  conhecer  a Deus por meio de Cristo. Também foram enriquecidos em toda “palavra” (logos), termo que alude a comunicação dessa revelação.

O presente se reflexa no versículo sete, quando o apóstolo declara que aos crentes não lhes falta nenhum carisma ou dom. Posto que foram enriquecidos em tudo, agora não lhes  falta  nada.  Isto não  quer  dizer  que  todos  os  cristãos  têm  os  dons;  mais  adiante,  no capítulo 12, o apóstolo explica que o Espírito Santo é quem distribui os dons a cada crente na  congregação.  Cada  igreja local  pode  ter  a  certeza  de  que  tem  recebido  tudo  o  que precisa.

Finalmente Paulo se move até o futuro. Essa igreja que foi enriquecida e à qual não falta nada está, no entanto, esperando ansiosamente a vinda de Cristo. Ainda que a igreja em  Corinto  havia  sido enriquecida  em  tudo,  estava  muito  longe  de  ser  perfeita,  como qualquer leitor da carta poderia se dar conta. Por isso Paulo vê o futuro, quando Cristo a confirmará definitivamente e a apresentará irrepreensível ante Deus.

Não há contradição entre esses três aspectos da identidade da igreja. Foi enriquecida no  passado, não  lhe  falta  no  presente  nenhum  dom  espiritual,  e  no  entanto  espera  sua perfeição final. Paulo conclui no versículo nove com uma declaração maravilhosa: Fiel é Deus, pelo qual fostes chamados para a comunhão de seu Filho Jesus Cristo nosso Senhor. (I Corintios 1:9)

Deus  nos  chamou  (passado  aoristo  no  grego)  para  ter  comunhão  com  Seu  Filho  Jesus Cristo. Nossa  experiência  presente  como  cristão  é  que,  dia  a  dia,  podemos  viver  em comunhão  com Jesus  Cristo.  Deus  é  fiel  e  por  Sua  fidelidade  podemos  ter  confiança  no futuro. Ele manterá suas promessas. A  identidade  da  igreja  se  encontra  nessa  tensão  entre  o  passado,  o  presente  e o futuro. Mantenhamos essa perspectiva, e demos graças a Deus porque o que somos, e o que seremos, o devemos a Sua graça e fidelidade.

A apelação de Paulo: Unidade da igreja

Rogo-vos,  irmãos,  em  nome  de  nosso  Senhor  Jesus  Cristo,  que  sejais concordes no falar, e que não haja dissensões entre vós; antes sejais unidos no mesmo pensamento e no mesmo parecer. Pois a respeito de vós, irmãos meus,  fui  informado  pelos  da  família  de  Cloé  que  há  contendas  entre vós. Quero dizer com isto, que cada um de vós diz: Eu sou de Paulo; ou, Eu de Apolo; ou Eu sou de Cefas; ou, Eu de Cristo. Será que Cristo está dividido? Foi Paulo  crucificado  por  amor  de  vós?  Ou  fostes  vós  batizados  em  nome  de Paulo? Dou graças a Deus que a nenhum de vós batizei, senão a Crispo e a Gaio; para que ninguém diga que fostes batizados em meu nome. É verdade, batizei também a família de Estéfanas, além destes, não sei se batizei algum outro. Porque Cristo não me enviou para batizar, mas para pregar o evangelho; não  em  sabedoria  de  palavras,  para  não  se tornar  vã  a  cruz  de  Cristo.  (I Corintios 1:10-17)

Depois da ação de graças, Paulo faz aos corintios uma apelação comovedora. Depois de agradecer a Deus  pelo  enriquecimento  dos  corintios  em  Cristo,  lhes  faz  um  chamado urgente, por causa da dolorosa divisão que há entre eles. Acaba de lhes escrever sobre sua comunhão e agora tem que os exortar pela sua falta de comunhão. Contudo, Paulo segue se dirigindo a eles como irmãos e irmãs. Quiçá o faz de propósito, para os lembrar que pertencem à família de Deus e que com seu comportamento, em alguma medida estão contradizendo sua identidade.

Paulo apela em nome de Cristo

No versículo dez, a palavra em grego significa literalmente que Paulo apela a eles através do  nome de Jesus  Cristo.  Paulo  não  estava  só  declarando  sua  autoridade  apostólica  ou falando  em nome de  Jesus  Cristo.  Os  exortava  no  único  nome  que  todos  os  cristãos invocam e no qual todos foram batizados. Essa era a base para sua apelação.

Paulo apela à unidade

Em um só versículo,  existem  várias  expressões  que  reforçam  a  apelação  do  apóstolo  à unidade. O  último  verbo  que  usa  é  muito  interessante.  Em  grego  é  o  verbo  catarizo, que fazia alusão a remendar ossos quebrados ou rede de pescar. É um verbo que denota a ação de reparar algo quebrado. No caso dos corintios, é a comunhão que tinha sido quebrada e Paulo sabe que eles a irão reparar.

Paulo apela diante da desunião

Tinham falado a Paulo sobre as discussões e divisões que havia entre os corintios. Este é o único dado que Paulo tem a respeito da situação. O versículo doze explica em que consiste o problema. No grego, a expressão que se traduz “sou de“ indica uma aliança ou pertencer a alguém.  Os  membros da  igreja  estavam  declarando  sua  aliança  ou  lealdade  a  diferentes apóstolos. Parece  ainda  que uma  destas  facções  reclamava  uma  união  particular  e  exclusiva com  Cristo.  Alguns comentaristas  têm  interpretado  que  esta  única  frase,  “eu  pertenço  a Cristo”, é um recurso retórico de Paulo para causar impacto. Mas as quatro expressões são idênticas  em  sua  estrutura gramatical  e  mais  bem  parece  indicar  que  este  quarto  grupo reclamava  uma  união  especial com  Cristo,  talvez  porque  eram  os  que  O  haviam  visto ou ouvido pessoalmente. Sugere-se  que entre  estes  grupos  havia  distintas  teologias  em  competição.  Na realidade, no texto não há nenhuma evidência deles. A divisão parece dever-se mais bem a personalidades em conflito do que a princípios ou correntes doutrinárias diferentes. Paulo se sente profundamente afetado por esse conflito e insiste com os corintios que ele é irmão deles assim como eles o são dele. Ele não é um mestre nem eles o pertencem e, portanto, eles não têm nenhum direito de fazer estas alianças que os dividem entre si. Ao  final  do  capítulo  3  da  mesma  carta,  Paulo  afirma  que  se  alguém pertence a alguém na igreja cristã, são os líderes quem pertencem a igreja, e não esta aos líderes.

Paulo apela ao essencial

Há  um  matiz  de  urgência  na  apelação  de  Paulo,  e  com  razão.  A  atitude  partidarista  ou separatista dos corintios tem implicações muito sérias. Esses desacordos, disse Paulo, são teologicamente  ofensivos  porque  contradizem  os  fundamentos  do  evangelho  em  três sentidos: contradizem a pessoa de Cristo, a cruz de Cristo e o significado do batismo em Cristo. Em outras palavras, Cristo era quem ficava ofendido e negado por todos os grupos. Paulo  mostra  que  essa conduta  é  inaceitável  por  meio  de  três  perguntas  retóricas, cada uma das quais se responde negativamente. Acaso está Cristo dividido? É sua primeira pergunta. Acaso há mais de um Cristo? Acaso fracionaram Cristo? Logicamente que não. Seria uma idéia ridícula. Existe um só Cristo, indivisível. A  segunda  pergunta  retórica  do  apóstolo  é:  Foi  Paulo  crucificado  por  vocês?  Em outras palavras, acaso vocês estão confiando em Paulo e sua crucificação para ser salvos? Aqueles que declaram pertencerem a Paulo estão supondo que ele é quem os redimiu. Só a idéia era absurda. Cristo, não Paulo, é quem foi crucificado por eles. E em terceiro lugar, acaso foram batizados no nome de Paulo? Há alguma razão para ter uma aliança especial com algum ser humano por causa do batismo?

Com  esta  argumentação,  Paulo  enuncia  três  verdades  essenciais  do  evangelho.  A primeira é que Cristo é um só e indivisível: há só um Cristo, há só uma cabeça do corpo de Cristo.  A  segunda verdade  é  que  Cristo  foi  crucificado  por  nós  e  como  conseqüência pertencemos só a Ele. A terceira afirmação tem relação com o batismo cristão. O batismo é testemunho de nossa aliança com Cristo e de nossa exclusiva lealdade a Ele. Paulo desenvolve o conceito do batismo com toda claridade em Romanos 6. Fomos batizados na morte e ressurreição de Cristo; a fé é “interna” e o batismo é a demonstração “externa” de que estamos unidos a Cristo em Sua morte e ressurreição. Em outras palavras, Sua morte é nossa morte e Sua ressurreição é nossa. Todos nós somos batizados em Cristo e só nEle. Paulo  sustenta  que,  com  sua  atitude  sectária,  os  corintios  negavam  as verdades essenciais  do  evangelho  porque  davam  a  líderes  humanos  a  posição  que  só  Cristo  tem. Sacrificavam  o  nome  de  Cristo,  em  cuja  morte  e  ressurreição  haviam  sido  batizados,  em troca pelo nome de um ser humano que só os havia batizado fisicamente. O apóstolo se mostra  agradecido de  não  haver  batizado  a  nenhum  deles,  salvo  a Crispo,  a  Gaio,  e  a  família  de  Estéfanas. Ninguém  mais  poderia  dizer  que  havia  sido batizado em seu nome.

O que Paulo enfatiza é que não tem importância alguma quem é o que batiza. O que realmente importa é em quem somos batizados: em Cristo mesmo. Obviamente, Paulo não diminui a importância do batismo. Sabe que foi instituído por Jesus e que é parte integral da Grande Comissão. Como se depreende de  Romanos  6,  o  apóstolo  tinha  uma  percepção profunda do batismo. Quanto a sua tarefa, Paulo se define como evangelista. É um pioneiro, chamado por Deus para levar a mensagem aos lugares onde ainda não havia sido pregado. Paulo afirma que sua pregação não foi com palavras de sabedoria humana “para não fazer vã a cruz de Cristo”. Descobrimos aqui uma dobre renuncia por parte do apóstolo. Renunciou à sabedoria do mundo para pregar a “loucura” da cruz. Ademais Paulo renunciou à retórica e confiou só no poder do Espírito Santo.

O que fazer com as diferenças?

Há uma tensão iniludível entre o que a igreja é e o que deve ser, entre o que a igreja já é e o que  chegará a ser.  Vivemos esta tensão em nossas congregações, tal  como  ocorria  na igreja em Corinto. A situação é especialmente evidente na desunião entre cristãos. Sem duvida há uma só igreja de Cristo, mas não mostramos e nem desfrutamos dessa unidade. A igreja é um povo santo de Deus, comprada pelo precioso sangue de Cristo e santificada pelo Espírito Santo.  No  entanto,  a  realidade  ambígua  da  igreja  é  um  desafio  para  que  busquemos santidade e procuremos unidade em torno da essência do evangelho da cruz de Cristo. Quando  há  diferenças  sobre  temas  teológicos  sérios, o Novo Testamento não só permite como ordena  a  separação  da  igreja.  Em  sua  carta,  o  apóstolo  João expõe com claridade as doutrinas que não devem ser toleradas dentro da igreja: aquelas que negam a humanidade de Jesus Cristo ou negam ao evangelho da graça gratuita por meio da cruz. Quem as sustenta merecem uma maldição ou juízo de Deus. Com a mesma severidade se expressa Paulo na carta aos Gálatas. As falsas doutrinas sobre a pessoa e a obra de Jesus Cristo  de  nenhuma maneira podem ser aceitas. Sobre estes assuntos deve aplicar-se a disciplina na igreja, até a excomunhão, porque são verdades centrais do evangelho. Em compensação, o que devemos fazer sobre os assuntos que são secundários, mas causam divisão? Há muitos temas que nos dividem. Ainda que todos creiamos no Pai, no Filho e no Espírito Santo, entramos em pleitos por muitos temas: a quantidade de água que se necessita para batizar alguém, a interpretação das profecias, porque cremos que certas profecias foram ou irão ser cumpridas. Até nos dividimos por questões culturais em relação a liturgia. Todos cremos nos dons, cremos que a igreja é o corpo carismático de Cristo e cremos nos ministérios de todos os crentes. No entanto, discutimos sobre quais são os dons mais importantes e como são recebidos.

Há inumeráveis polemicas sobre assuntos secundários. Como diferenciamos o primário do secundário, o central e o marginal? Sugiro uma norma que pode ajudar quando queremos dialogar entre cristãos bíblicos, isto  é,  entre  cristãos  que  consideram  a  Bíblia  como  máxima  autoridade. Se estivermos igualmente dispostos a submeter-nos à autoridade das Escrituras e chegarmos a decisões diferentes sobre um tema, então devemos concluir que esse é um assunto secundário. Se as escrituras  não  são  claras  para  nos  levar  a  uma  conclusão  única,  significa  que  esse assunto não é  central  ao  evangelho  e  que  sobre  esse  tema  devemos  aceitar  e  respeitar nossas diferenças. Estes  são  temas  aos  quais  chamamos de adiáfora,  isto  é, assuntos que não são essenciais senão marginais. Um breve epigrama que vem do século XVII, e que se adjudica a Ruperto Meldinius, é de muita ajuda neste terreno. Traduzido do latim, expressa:

No essencial, unidade.
No que não é essencial, liberdade.
Em todas as coisas, caridade.

Não tem dúvida de que a igreja pode ser uma comunidade mais harmoniosa e uma esfera mais feliz se nos esforçarmos por viver com este critério. Não deveríamos brigar por assuntos doutrinais secundários. Muito menos brigar por zelos, por ambição ou por questões de personalidade, como ocorreu na igreja em Corinto e ocorre hoje em muitos lugares. Pergunto-me que aconteceria com as divisões eclesiásticas se  pudéssemos  pensar  sobre  isto  de  maneira  honesta.  Muitas  das  nossas divisões respondem mais a diferenças culturais que teológicas. Outras, mais a temperamentos que a princípios  doutrinários.  E  muitas  são  causadas  por  ambições  pessoais  mais  do  que  por ambição em Cristo. Examinemos  nossas  motivações.  Tenhamos  cuidado,  ao  pregar  e  batizar,  de não estimular às pessoas a se sentirem mais leal a nós do que ao Senhor. Isto era o que havia horrorizado  Paulo. Substituir o nome de Cristo pelo nosso próprio nome é contradizer o evangelho. O apóstolo culmina o capítulo 1 com um chamado à humildade. Pede que ninguém se jacte em outros seres humanos e muito menos em si mesmo: “O que se gloria, glorie-se no Senhor” (1:31). Esse é o essencial. Que  nosso  anelo  seja  estar  cada  vez  mais  centrados  em  Jesus  Cristo,  tanto  em
nossa doutrina como em nossa vida.

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FONTE: Livro, "SINAIS DE UMA IGREJA VIVA" - JOHN STOTT

13:03
 “Dizia, pois, Jesus aos judeus que nele creram: Se vós permanecerdes na minha palavra, verdadeiramente sois meus discípulos; e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”
(João 8: 31- 32).

“A fé vem pelo ouvir, e ouvir pela palavra de Deus” ; de acordo com o que lemos no verso 30, “Ditas estas palavras, muitos creram nele”. Assim Ele ensinou, e assim eles creram; como o apóstolo colocou, “Assim pregamos e assim crestes”. É sempre em conexão com a palavra da verdade que o Espírito Santo opera em nós. A voz de Cristo e a mão do Espírito Santo andam juntas. Encontramos isso em nosso texto, mas encontramos mais do que isso.

O recebimento da palavra de Cristo dá início ao discipulado. Talvez haja muitos pensamentos ansiosos antes disso, muitas lágrimas, muitos gemidos amargos. Talvez haja susto, inquietação e questionamento. Mas isso não é discipulado. Entretanto, tais coisas são como muitas tentativas de ensinamento; muitas informações segundo uma escola e um professor, os quais irão de encontro aos desejos da alma. O mundo inteiro está, em seu pobre e obscuro caminho, estendendo suas mãos em busca de algo que somente pode ser concretizado em Cristo. Porém isso não é discipulado.

Todos os homens estão perguntando, 'Quem nos mostrará algo bom? ' Porém isso não é discipulado. O discipulado começa por receber a Sua palavra. Não com o fazer algo grande, mas com o receber Sua palavra; recebê-la como o aluno recebe o ensinamento do mestre.

Ele é a Palavra; e Ele anuncia a palavra. Qual é esta palavra que Ele anuncia?

É uma palavra (a) referente ao Pai (b) referente a Ele mesmo. Ele vem como o revelado do Pai, e anunciador de Si mesmo e de Sua obra. No momento em que recebemos aquilo que Ele nos diz referente ao Pai e a Si mesmo, nos tornamos Seus discípulos, Seus alunos. Assim somos ensinados, não por homens, mas por Deus. Este é o verdadeiro, o autêntico início do discipulado.

Permanecer naquela palavra é o teste do verdadeiro discipulado. Nosso Senhor colocou grande ênfase neste ponto; permanecer na Sua palavra. Não é a permanência em adesão geral a Sua causa, mas permanência na Sua palavra naquela palavra, pelo recebimento da qual nos tornamos discípulos. “A palavra de Cristo habite em vós ricamente” (Colossenses 3: 16) diz Paulo; e é esta palavra que contém tudo o que precisamos.

É uma palavra expansiva, sempre ampliando suas dimensões, crescendo em nós. Nunca é velha, nunca é nova; nela fazemos contínuas descobertas. É a mesma árvore, porém sempre produzindo novos ramos e folhas o mesmo rio, mas sempre expandindo e ampliando. É uma palavra vivificadora, produtora da nova. “Tua palavra me vivificou” (Salmos 119: 50). É uma palavra fortalecedora, que nos encoraja e nos revigora; nos levanta quando prostrados; confere saúde, coragem, resolução e persistência.

É uma palavra santificadora. Ela purifica; detecta o mal e o expurga; derrama santidade na alma. Ela opera uma obra interior abençoada. Continuemos nela; não nos cansemos dela; não percamos o gosto por ela, mas habitemos nela.

O conhecimento da verdade é o resultado do discipulado. Temos visto as propriedades e virtudes da palavra em si mesma; notemos a comunicação destas ao discípulo. Todos os que entram nesta escola e que se põem sob o ensinamento desse instrutor são ensinados por Deus; conforme está escrito, “E serão todos ensinados por Deus” (João 6: 45). Ele deve conhecer a verdade; não uma verdade, nem parte dela, mas a verdade, a totalidade dela a verdade e não o engano dEle que é a verdade. Ele deve ser sábio, sábio em Cristo, nEle que é nossa sabedoria. Ele deve conhecê-la, não supô-la, nem especular sobre ela, nem ter uma noção dela; mas conhecê-la, compreendê-la, escolhê-la, apreciá-la. A verdade é Cristo mesmo, o professor da verdade é Cristo, Ele é ambos professor e lição. O conhecimento de Cristo é o conhecimento da verdade; sempre crescente tanto em extensão como em profundidade. A promessa de Cristo para o discípulo é, “Conhecereis a verdade”.

Abençoada promessa num dia de dúvida e engano.

Esta verdade é liberdade. Toda verdade é liberdade, e o engano escravidão; um pouco de verdade é imensa liberdade, e um pouco de engano é imensa escravidão. Abençoadas são estas palavras do Mestre, “A verdade vos libertará”. A escravidão, para muitos, simplesmente está associada à tirania, mau governo, despotismo civil ou eclesiástico. As palavras de Cristo vão além e mais profundo. Elas vão à raiz do mal. A verdadeira cadeia, a verdadeira prisão, a verdadeira escravidão está no interior e não no exterior; assim, a verdadeira liberdade é interior, não exterior. Ela brota daquilo que uma pessoa conhece de Deus e do Seu Cristo. Raramente compreendemos isso. Engano? Escravidão? Como pode ser, dizemos, se o engano for o feito voluntário da própria pessoa? Se for o resultado dos seus próprios esforços intelectuais? Se não está relacionado com muros de prisão ou a opressão do poder? Mas o Mestre é muito explicito. A verdade vos libertará! Não há outra liberdade, digna do título, da qual esta não seja a fonte. 'Ele é o homem livre quem a verdade faz livre; e fora dela todos são escravos'.

Sejam livres! Diz o Filho de Deus aos filhos dos homens. Como? Tornando-se Meus discípulos, conhecendo a verdade que ensino e seguindo-Me. Se o Filho os libertar, verdadeiramente sereis livres!

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Do livro 'Studies in the Gospel of John' (Estudos do Evangelho de João)
Fonte: http://www.reavivamentos.com/

10:49
John Gill
A regeneração pode ser considerada de forma mais ampla, incluindo a chamada eficaz, a conversão e a santificação; ou de forma mais restrita, designando o primeiro princípio de graça infundido na alma. [Isto] faz da alma um objeto preparado para a chamada eficaz, um vaso apropriado à conversão, sendo também a fonte daquela santidade que é gradualmente desenvolvida na santificação e aperfeiçoada no céu. No que diz respeito à regeneração, os seguintes fatos devem ser examinados com atenção: o que é a regeneração ou... a sua natureza, que é tão misteriosa, desconhecida e inexplicável para um homem natural, como o foi para Nicodemos, embora ele fosse um mestre em Israel. Nós a compreenderemos melhor observando as expressões e termos pelos quais a regeneração é apresentada:

1. Nascer de novo — isto é o que a regeneração significa (veja Jo 3.3, 7; 1 Pe 1.3, 23). Esta expressão supõe um nascimento anterior, um primeiro nascimento, em relação ao qual a regeneração é o segundo. Se observarmos a diferença entre os dois nascimentos, os conceitos ficarão mais claros. Esses nascimentos são opostos entre si: o primeiro vem de pais pecadores e acontece à imagem deles; o segundo vem de Deus e acontece à imagem dEle. O primeiro é de semente corruptível, o segundo, de incorruptível. O primeiro acontece em pecado, o segundo, em santidade e justiça. Por meio do primeiro nascimento, os homens são corrompidos e depravados; pelo segundo, eles se tornam consagrados e começam a ser santos. O primeiro nascimento é carnal; o segundo é espiritual, transformando os que passam por ele em homens espirituais. Por meio do primeiro nascimento, os homens são loucos e insensatos; nascem como crias de asnos monteses. Por meio do segundo nascimento, eles se tornam instruídos e sábios para a salvação. Por meio do primeiro nascimento, eles são escravos do pecado e das paixões carnais: sua condição de escravo é inata. Por meio do segundo nascimento, eles se tornam os libertos de Cristo. Por meio do primeiro nascimento, eles são transgressores e seguem um caminho de pecado, até que são interrompidos pela graça. No segundo nascimento, eles param de cometer pecados, isto é, param de seguir o caminho de pecado, passando a viver em santidade. Sim, aquele que é nascido de Deus não vive em pecado. Por meio do primeiro nascimento, os homens são filhos da ira e estão sob o desprazer divino; no segundo nascimento, eles se tornam objetos do amor de Deus, sendo a regeneração o fruto e o efeito desse amor...

2. Nascer do alto — assim poderia ser traduzida a expressão de João 3.3, 7. O apóstolo Tiago disse, de um modo geral, que toda boa dádiva e todo dom perfeito vêm do alto; e a regeneração, sendo esse tipo de dádiva, deve vir do alto... “Pois, segundo o seu querer, ele nos gerou pela palavra da verdade” (Tg 1.17-18). O autor desse nascimento é do alto; e os que nasceram de novo nasceram de Deus Pai, que está no céu. A graça concedida na regeneração vem de cima (Jo 3.27). A verdade no íntimo, a sabedoria no espírito ou a graça de Deus no coração, produzida na regeneração, é a sabedoria que vem do alto (Tg 3.17). Assim são os nascidos de novo, pois eles são nascidos do alto, têm excelente nascimento, são participantes da vocação soberana e celestial de Deus, em Cristo Jesus, e certamente a possuirão (1 Pe 1.3-4; Hb 3.1; Fp 3.14).

3. É comum a regeneração ser expressa por novo nascimento; e com grande propriedade, visto que o lavar regenerador e renovador do Espírito Santo estão juntos, como que significando a mesma coisa. A regeneração produz o que as Escrituras chamam de nova criatura e novo homem, e os nascidos de novo são chamados de crianças novamente nascidas (Tt 3.5; 2 Co 5.17; Ef 4.24; 1 Pe 2.2). É um novo homem em oposição ao velho ou ao princípio da natureza corrupta, que é tão antigo quanto o homem. Mas o princípio da graça infundido na regeneração é novo. É algo novo, inserido no coração; é algo que antes nunca esteve na natureza humana, nem mesmo em Adão, quando vivia em seu estado de inocência. Não é uma influência sobre os velhos princípios da natureza, nem a elevação deles a um grau superior. Não é uma melhoria dos velhos princípios, nem uma correção da imagem de Deus corrompida e arruinada no homem. É uma obra totalmente nova. É chamada de nova criatura; é uma obra realizada pelo poder onipotente, uma nova criatura, um novo homem constituído de várias partes, todas elas novas. Nessa nova criatura, existem um coração novo, um espírito novo, uma mente nova, para conhecer e entender coisas que antes não podiam ser conhecidas nem entendidas — um novo coração para conhecer a Deus, não como o Deus da natureza e da providência, e sim como o Deus da graça, Deus em Cristo, Deus em um Mediador, o amor de Deus nEle, a aliança da graça e as bênçãos dessa aliança estabelecida nEle. [É um novo coração para conhecer] a Cristo e a plenitude da graça nEle, o perdão do pecado por meio de seu sangue, a justificação por meio de sua justiça, a redenção por meio do seu sacrifício, aceitação diante de Deus por meio dEle e completa salvação por intermédio dEle — coisas sobre as quais Adão nada sabia no Paraíso.

Neste novo coração, há novos desejos por esses objetos, para conhecer mais sobre eles; há novas afeições colocadas sobre eles, novos deleites neles e novas alegrias que surgem deles (Ez 36.26; 1 Jo 5.20; 1 Co 2.9). Este novo homem enxerga com novos olhos. Deus não concede a algumas pessoas olhos para ver coisas divinas e espirituais, mas Ele os concede para os nascidos de novo. Eles têm olhos que vêem, feitos pelo Senhor (Dt 29.4; Pv 20.12), com os quais eles vêem seu estado de perdição, sua condição natural, a excessiva corrupção do pecado, sua incapacidade de se redimir por meio do que possam fazer. [Vêem] a insuficiência de sua justiça, sua incapacidade de fazer boas obras e a falta de poder para ajudarem a si mesmos a livrarem-se do estado e da condição em que estão. [Vêem sua necessidade] do sangue, da justiça e do sacrifício de Cristo, e da salvação por intermédio de Cristo. Eles têm os olhos da fé com os quais contemplam as glórias da pessoa de Cristo, a plenitude de sua graça, a excelência de sua justiça, a virtude de seu sangue e sacrifício, o benefício e a perfeição de sua salvação. Neste aspecto, a regeneração não é outra coisa senão luz espiritual no entendimento.

Além disso, o novo homem tem novos ouvidos. Nem todos têm ouvidos para ouvir. Alguns têm e os receberam do Senhor; e benditos são eles (Ap 2.11; Dt 29.4; Pv 20.12; Mt 13.16-17). Ouvem a Palavra de um modo como nunca ouviram antes. Eles a entendem e passam a amá-la; por meio dela, distinguem a voz de Cristo da voz de um estranho, de modo que sentem-na agir neles com eficácia e tornar-se o poder de Deus para a salvação deles. Conhecem o jubiloso som e regozijam-se em ouvi-lo!

O novo homem também tem novas mãos com as quais pode agir: a mão de fé para receber a Cristo como Salvador e Redentor, para apropriar-se dEle para a vida e a salvação, para recebê-Lo, para apegar-se a Ele e não deixá-Lo ir embora. [Eles têm mãos] para tocá-Lo, a Palavra da vida, e receber dEle graça sobre graça. Têm mãos com as quais podem servir motivados por princípios melhores, a fim de atingir objetivos melhores do que os anteriores.

Eles têm novos pés, com os quais correm para Cristo, a Cidade de refúgio; andam pela fé, prosseguem nEle, assim como O receberam; atravessam com alegria os caminhos de suas ordenanças, seguem-No com empenho e continuam a conhecê-Lo. Têm novos pés com os quais podem correr e não se fatigar, andar e não desfalecer.

4. A regeneração é expressa por ser vivificado. Assim como há, na criação natural, um momento em que a vida passa a existir, na regeneração acontece o mesmo. “Ele vos deu vida” (Ef 2.1). Antes da regeneração, os homens estão mortos, embora vivam; ainda que estejam fisicamente vivos, estão moralmente mortos; estão mortos em um sentido moral para as coisas espirituais, em todas as forças e capacidades de sua alma. Não as conhecem, não têm afeição por elas, amor por elas ou poder de realizá-las, à semelhança de um homem morto em relação às coisas naturais. Entretanto, na regeneração um princípio de vida espiritual é infundido no homem; é um tempo em que o Senhor lhes transmite vida e a produz neles. Cristo é a ressurreição e a vida neles. [Ele] os ressuscita da morte do pecado para uma vida de graça. O espírito da vida de Cristo entra neles.

A regeneração é uma passagem da morte para a vida. É um princípio de vida espiritual implantado no coração, em conseqüência do qual um homem inspira um senso espiritual. Onde há fôlego, há vida. Deus soprou em Adão o fôlego de vida, e este se tornou uma alma vivente, uma pessoa viva que, em resposta, respirou. Assim, o Espírito de Deus sopra em ossos secos, e eles vivem e passam a respirar. A oração é a respiração espiritual de um homem regenerado. “Ele está orando” (At 9.11) é algo observado sobre Saulo após sua regeneração. Um pouco antes ele respirava ameaças e morte contra os discípulos de Cristo. Um homem regenerado respira oração a Deus e suspira por Ele, por conhecê-Lo mais em Cristo, por ter comunhão com Ele, por manifestações de seu amor e, em especial, pela benevolente graça e misericórdia. Às vezes, estas respirações e desejos são expressos apenas por suspiros e gemidos, mas ainda são sinais de vida. Se um homem suspira, é claro que está vivo.

O homem regenerado deseja intensamente o alimento espiritual; e isso demonstra que ele foi vivificado. Logo que uma criança nasce, ela procura o seio materno em busca de leite. Assim, os recém-nascidos espirituais desejam o genuíno leite da Palavra, por meio do qual eles podem crescer. Seus sentidos espirituais são exercitados em assuntos espirituais. Têm o que corresponde aos sensos da vida natural: o ver, o ouvir e, como já observamos, o sentir. Eles sentem o fardo do pecado na consciência e as obras do Espírito de Deus em seu coração; e confiam em Cristo, a Palavra da vida — isso deixa evidente o fato de que estão vivos: um morto nada sente. Têm uma inclinação espiritual, um deleite nas coisas espirituais; a Palavra de Cristo lhes é mais doce ao paladar do que o mel ou o favo de mel... Eles provam que o Senhor é gracioso e convidam outros a provar e ver também quão bom Ele é. Eles se deleitam com as coisas de Deus e não dos homens. Cristo e sua graça lhes são agradáveis... Estes sensos espirituais e o exercício deles... mostram que estão vivos, que nasceram de novo. Essas pessoas levam uma vida de fé; vivem por fé — não a fé em si mesma, mas em Cristo, o objeto da fé. Crescem em Cristo, a Cabeça deles, de quem recebem sustento e assim crescem no crescimento que vem de Deus; e isto é uma evidência de vida. Resumindo, eles vivem uma vida nova, diferente da que tinham antes; não vivem mais para si mesmos ou para as paixões dos homens, e sim para Deus e para Cristo, que morreu e ressuscitou por eles. Andam em novidade de vida.

5. A regeneração é demonstrada pela formação de Cristo na pessoa convertida(Gl 4.19). A imagem dEle é gravada na regeneração; não a imagem do primeiro Adão, e sim a do segundo Adão. Pois o novo homem é feito segundo a imagem dAquele que o criou de novo, é a imagem de Cristo. Os eleitos de Deus são predestinados a serem conformados a esta imagem; e isso acontece na regeneração (Rm 8.29; Cl 3.10). As graças de Cristo — fé, esperança e amor — são produzidas no coração da pessoa regenerada e logo se tornam visíveis. Sim, o próprio Cristo vive neles. O apóstolo Paulo disse: “Não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim; e esse viver que, agora, tenho na carne, vivo pela fé” (Gl 2.20). Cristo e o crente vivem mutuamente um no outro.

6. A regeneração é explicada como o ser co-participante da natureza divina (2 Pe 1.4). Isto não significa que o nascido de novo se torna participante da natureza essencial de Deus: uma criatura não pode participar da essência divina, e esta não pode ser comunicada à criatura. Isto seria deificar os homens. Muitas das perfeições divinas são totalmente incomunicáveis, como a eternidade, a imensidade, etc. Os nascidos de novo também não participam danatureza divina da mesma maneira como Cristo participa, pela união pessoal e hipostática das duas naturezas nEle, a união em que a plenitude da divindade habita corporalmente nEle. Mas a regeneração produz na alma uma semelhança com a natureza divina em espiritualidade, santidade, bondade, benevolência, etc.; por isso, a regeneração também recebe essa designação.


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22:22
Sermos livrados da sentença da condenação da Lei Divina é a benção fundamental da salvação de Deus: enquanto continuamos sob a maldição, não podemos ser nem santos nem felizes. Porém, em relação à natureza desta libertação, em que exatamente consiste, sobre  que  fundamento  é  obtida,  e por  quais  meios  é  assegurada,  existe  na  atualidade muita confusão. A maioria dos erros que se tem generalizado sobre este tema surgiram da  falta  de  uma  clara  observação  do  assunto  em  si mesmo,  e  até  que  entendamos verdadeiramente o que a justificação é, não estamos em posição nem de afirmar nem de negar algo com respeito a ela. Pó isso, estimamos necessário dedicar um capítulo inteiro a uma cuidadosa definição e explicação desta palavra “justificação”, esforçando-nos em mostrar o que ela significa, e o que ela não significa.

Entre  os  protestantes  e  os  romanistas  há  uma  ampla  diferença  de  opinião  acerca  do significado  do  termo  “justificar”:  eles  afirmam  que  justificar  é  fazer  intrinsecamente justo e santo, nós insistimos que justificar significa somente pronunciar formalmente ou declarar legalmente justo. O papismo inclui com a justificação, a renovação da natureza moral do homem ou a libertação da corrupção, assim confundem a justificação com a regeneração e a santificação. Contrariamente, todos os protestantes representativos têm mostrado que a justificação não se refere a uma mudança do tipo moral, porém a uma mudança de estado legal; ainda que reconhecendo, certamente, declarando com firmeza, que uma mudança radical de caráter invariavelmente acompanha a justificação. É uma mudança legal desde um estado de culpabilidade e condenação a um estado de perdão e aceitação; e esta mudança é devido exclusivamente a um ato gracioso de Deus, baseada sobre a justiça de Cristo sendo imputado a Seu povo (não tendo eles nenhuma própria).

“Nós explicamos a justificação simplesmente como uma aceitação pela qual Deus nos recebe em Seu favor e nos estima como pessoas justas; e dizemos que ela consiste na remissão dos pecados e na imputação da justiça de Cristo....A justificação, portanto, não é outra coisa que uma absolvição de culpabilidade daquele que foi acusado, como se sua inocência houvesse sido provada. Já que Deus, portanto, nos justifica pela mediação de Cristo, Ele nos desculpa, não por um reconhecimento de nossa inocência pessoal, mas por  uma  imputação  de  justiça;  de  maneira  que,  ainda  que  somos  injustos  em  nós mesmos, somos considerados como justos em Cristo” (João Calvino, 1559)”.

“O que é justificação? Resposta: Justificação é um ato da livre graça de Deus para com os pecadores, no qual Ele os perdoa, aceita e  considera justas as suas pessoas diante dEle, não por qualquer coisa neles operada, nem por eles feita, mas unicamente pela perfeita obediência e plena satisfação de Cristo, a eles imputada por Deus e recebidas só pela fé” (Catecismo de Westminster, 1643).

“Assim definimos a justificação de um pecador conforme ao Evangelho: É um judicial, porém gracioso ato de Deus, pelo qual o pecador escolhido e crente é absolvido da culpa de  seus  pecados, e  adquire  um  direto  à  vida  eterna  concedida  a  ele,  por  causa  da obediência de Cristo, recebida pela fé” (H. Witsius, 1693).

“Se diz que uma pessoa é justificada quando ela é considerada por Deus como livre da culpa do pecado e seu merecido castigo; e como tendo aquela justiça pertencendo-lhe, isso lhe dá o direito à recompensa da vida” (Jonathan Edwards, 1750).

A justificação, então, não se refere a alguma mudança subjetiva produzida na atitude de uma pessoa, porém é exclusivamente uma mudança objetiva em sua posição em relação à lei. Que a justificação é impossível que possa significar fazer a uma pessoa justa ou boa intrinsecamente é mais claramente visto a partir do uso do termo em si na Escritura. Por exemplo, em Provérbios 17:15 lemos: “O que justifica o ímpio, e o que condena o justo, tanto um como o outro são abomináveis ao SENHOR”. Agora bem, obviamente quem  muda  a  um  “ímpio”  fazendo-o  uma  pessoa  justa  está  longe  de ser  uma “abominação ao Senhor”, porém o que o sabendo disso, diz que uma pessoa ímpia é justa, é aborrecível a Ele.

Também em Lucas 7:29 lemos: “E todo o povo que o ouviu e os publicanos, tendo sido batizados com o batismo de João, justificaram a Deus”. Quão impossível é fazer que as palavras “justificaram a Deus” signifique alguma transformação moral de Seu caráter; porém aquelas palavras devem ser entendidas como que eles declararam que Ele é justo, e toda ambigüidade é tirada. Uma vez mais, em 1 Timóteo 3:16 nos é dito que o Filho encarnado  foi  “justificado  no  (ou  “pelo”)  Espírito”,  isto  é, Ele  foi  publicamente reivindicado em Sua ressurreição, declarado inocente ante as denuncias blasfemas com que os judeus Lhe acusaram.

A  justificação  trata  somente  do  aspecto  legal  da  salvação.  É  um  termo  judicial,  uma palavra dos tribunais de justiça. É a sentença de um juiz sobe uma pessoa que tem sido trazida  diante  dele para  ser  julgada.  É  aquele  ato  da  graça  de  Deus  como  Juiz,  na elevada corte do Céu, pelo qual Ele dita que um pecador escolhido e crente é libertado da penalidade da lei, e totalmente restaurado ao favor divino. É a declaração de Deus de que a parte acusada está totalmente de acordo com a lei; a justiça o desculpa porque a justiça tem sido satisfeita. Assim, a justificação é aquela mudança de estado pela qual um, que sendo culpável diante de Deus e portanto sob a sentença condenatória da Sua Lei, e merecedor de nada exceto de um eterno apartamento de Sua presença, é recebido em Seu favor e se lhe dá um direito a todas as bênçãos que Cristo adquiriu para Seu povo, por Sua perfeita satisfação.

Na  demonstração  da  definição  dada,  o  significado  do  termo  “justificar”  pode  ser determinado, primeiro, pelo seu uso nas Escrituras. “Então disse Judá: Que diremos a meu  senhor?  Que falaremos?  E  como  nos  justificaremos?”  (esta  palavra  hebraica “tsadag” sempre significa “justificar”) (Gênesis 44:16). Aqui temos um assunto que era inteiramente  judicial.  Judá  e  seus irmãos  foram  levados  para  comparecer  diante  do governador do Egito, e estavam preocupados sobre como poderiam obter uma sentença em  seu  favor.  “Quando  houver  contenda  entre  alguns, e  vierem  a  juízo,  para  que  os julguem,  ao  justo  justificarão,  e  ao  injusto  condenarão”(Deuteronômio  25:1).  Aqui novamente vemos claramente que o termo é de tipo legal, usado em conexão com os procedimentos  dos  tribunais  legais,  implicando  um  processo  de  investigação  e juízo. Deus pôs aqui uma regra para reger aos juízes de Israel: eles não deviam “justificar” ou ditar uma sentença em favor do culpado: comparar 1 Reis 8:31,32. 

“Se eu me justificar, a minha boca me condenará; se for perfeito, então ela me declarará perverso” (Jó 9:20): a primeira parte desta frase é explicada na segunda - “justificar” ali não pode significar fazer santo, porém pronunciar uma sentença em meu próprio favor. “E acendeu-se a ira de Eliú, filho de Baraquel, o buzita, da família de Rão; contra Jó se acendeu a sua ira, porque se justificava a si mesmo, mais do que a Deus” (Jó 32:2), o que obviamente significa, porquanto ele se declarava sem culpa a si mesmo mais que a Deus.  “Para  que  sejas  justificado  quando  falares,  e  puro  quando julgares”  (Salmos 51:4), o que significa que Deus atuando em Sua função judicial poderia ser declarado justo em ditar sentença. “Mas a sabedoria é justificada por seus filhos” (Mateus 11:19), o que  significa  que  os  que  são  realmente  regenerados  por  Deus  tem  considerado  a sabedoria  de Deus  (que  os  escribas  e  fariseus  consideravam  necessidade)  ser,  como realmente é, perfeita sabedoria: eles lhe tiraram a calúnia de ser loucura.

2.  A  força  precisa  do  termo  “justificar”  pode  ser  averiguada  notando  que  este  é  a antítese  de “condenar”.  Agora  bem,  condenar  não  é  um  processo  pelo  qual  um  bom homem  é  feito  mal, mas  é  a  sentença  de  um  juiz  sobre  alguém  porque  ele  é  um transgressor da lei. “O que justifica o ímpio, e o que condena o justo, tanto um como o outro são abomináveis ao SENHOR” (Provérbios 17:15 e ver também Deuteronômio 25:1). “Porque por tuas palavras serás justificado, e por tuas palavras serás condenado” (Mateus 12:37). “É Deus quem os justifica. Quem é que condena?” (Romanos 8:33,34).

Ora, é inegável que a “condenação” é a declaração de uma sentença contra uma pessoa pela qual a pena prescrita pela lei lhe é atribuída e é ordenada para ser aplicada sobre ela; por conseguinte, a justificação é a declaração de uma sentença em favor de uma pessoa,  pela  qual  a  recompensa prescrita  pela  lei  é  ordenada  para  ser-lhe  outorgada.

3.  Que  a  justificação  não  é  uma  mudança  experimental  desde  a  pecaminosidade  à santidade, mas uma mudança judicial desde a culpabilidade à não condenação pode ser evidenciado pelos termos equivalentes utilizados. Por exemplo, em Romanos 4:6 lemos: “Assim também Davi declara bem-aventurado o homem a quem Deus imputa a justiça sem as obras”: assim que a justiça legal não é uma conduta implantada no coração, mas um dom cedido a nossa conta. Em Romanos 5:9,10 ser “justificados pelo seu sangue” é o mesmo que ser “reconciliados com Deus pela morte de seu Filho”, e a reconciliação não  é  uma  transformação  de  caráter,  mas  o  obter  a  paz  pela  remoção  de tudo  o  que causa  ofensa.

4. A partir do fato de que o aspecto judicial de nossa salvação é proposto nas Escrituras sob as figuras de um juízo em um tribunal de justiça e uma sentença. “(1) Se supõe um juízo, sobre o qual o salmista implora que este não se desenvolva de acordo com a lei: Salmo 143:2. (2) O Juiz é o próprio Deus: Isaías 50:7,8. (3) O tribunal onde Deus está sentado para o juízo é o trono da graça: Hebreus 4:16. (4) Uma pessoa culpada. Ela é o pecador, que é tão culpado de pecado como para ser abominável ante o juízo de Deus: Romanos 3:18. (5) Os acusadores estão prontos para propor e promover as acusações contra a pessoa culpada; estes são a lei (João 5:45), a consciência (Romanos 2:15), e Satanás  (Zacarias 3:2  e  Apocalipse  12:10). (6) A acusação é admitida e redatada em uma “ata”  em  forma  de  lei,  e  é  posta  diante  do  tribunal  do  Juiz,  no  foro,  para  a libertação do criminoso: Colossenses 2:14. (7) Se prepara uma defesa no Evangelho em favor da pessoa culpada: esta é a graça, através do sangue de Cristo, o resgate pago, a eterna justiça trazida pelo Fiador do pacto: Romanos 3:23,25; Daniel 9:24. (8) A Ele somente açude o pecador,  renunciando a toda outra desculpa ou  defesa  qualquer  que sejam:  Salmos  130:2,3;  Lucas  18:13.  (9)  Para  fazer  eficaz esta  súplica  temos  um advogado com o Pai, e Ele apresenta Sua própria propiciação por nós: 1 João 2:1,2. (10) A sentença acerca disto é a absolvição, por causa do sacrifício e da justiça de Cristo; com a  aceitação  no  favor,  como  pessoas  aprovadas  por  Deus:  Romanos  8:33,34;  2 Coríntios 5:21” (John Owen).

Na base do que temos visto, podemos perceber o que a justificação não é. Primeiro , ela é distinta da regeneração: “aos que chamou a estes também justificou” (Romanos 8:30). Ainda  que  juntos inseparavelmente,  o  chamamento  eficaz  ou  o  novo  nascimento  e  a justificação  são  bastante distintos.  Um  nunca  está  separado  do  outro,  ainda  que  eles devam ser confundidos. Na ordem natural, a regeneração precede à justificação, ainda que não é de nenhuma maneira a causa ou o fundamento dela: ninguém é justificado até que creia, e ninguém crê até que seja convencido. A regeneração é o ato do Pai (Tiago 1:18), a justificação é a sentença do Juiz. Uma me dá um lugar na família de Deus, a outra me assegura uma posição diante de Seu trono. Uma é interior, sendo a concessão da vida divina à minha alma: a outra é exterior, sendo a imputação da obediência de Cristo à minha conta. Por uma eu sou levado de regresso arrependido à casa do Pai, por outra  se  me  dá uma  “melhor  vestidura”  que  me  prepara  para  Sua  presença. Segundo,  ela  difere  da santificação.  A  santificação  é  moral  ou  experimental,  a justificação é legal ou judicial. A santificação resulta da operação do Espírito em mim, a justificação é baseada no que Cristo fez por mim. Uma é gradual e progressiva nesta vida; a outra é completa e não admite adição. Uma tem que ver com meu estado, a outra tem  que  ver  com  minha  posição  diante  de  Deus.  A  santificação produz  uma transformação de caráter; a justificação é uma mudança de status legal: é uma mudança desde a culpa e condenação ao perdão e aceitação, e isto somente por um ato de graça por parte de Deus, fundamentado sobre a imputação da justiça de Cristo, por meio do instrumento  da  fé somente.  Ainda  que  a  justificação  está  totalmente  diferenciada  da santificação contudo, a santificação sempre a acompanha.

Terceiro,  ela  difere  do  perdão.  Em  algumas  coisas  concordam.  Somente  Deus  pode perdoar pecados (Marcos 2:7) e somente Ele pode justificar (Romanos 3:30). Sua livre graça é a única causa impulsora em um (Efésios 1:17) e da outra (Romanos 3:24). O sangue de Cristo é a causa que adquire ambos por igual: Mateus 26:28, Romanos 5:9. Os objetos sãos os mesmos: as pessoas que são perdoadas são justificadas, e as mesmas que são justificadas são perdoadas; aos que Deus imputa a justiça de Cristo para sua justificação,  Ele  lhes  dá  a  remissão  de  pecados;  e  aos  que  Ele  não culpa  de  pecado, senão que lhes perdoa, a eles lhes atribui justiça sem obras (Romanos 4:6-8). Ambos são recebidos pela fé (Atos 26:18, Romanos 5:1). Porém ainda que concordem nestas coisas, em outras se diferenciam.

De Deus se diz ser “justificado” (Romanos 3:4), porém seria blasfêmia falar dEle como sendo “perdoado” - isto mostra imediatamente que as duas coisas são diferentes. Um criminoso poderia ser perdoado, porém somente uma pessoa justa pode ser realmente justificada.  O  perdão  trata somente com  os  atos  de  um  homem,  a  justificação  com  o homem  em  si.  O  perdão  considera  aos pedidos  de  clemência,  a  justificação  aos  de justiça. O perdão somente livra da maldição causada pelo pecado; a justificação além disso,  outorga  um  direito  ao  céu.  A  justificação  se  aplica  ao crente  com  respeito  às demandas da lei, o perdão com respeito ao Autor da lei. A lei não perdoa, já que ela não admite  afrouxamento;  porém  que  Deus  perdoa  as  transgressões  da  lei  em  Seu povo provendo uma satisfação à lei, adequada a suas transgressões. O sangue de Cristo foi suficiente para proporcionar o perdão (Efésios 1:7), porém Sua justiça é necessária para a justificação (Romanos 5:19). O perdão liberta da morte (2 Samuel 12:13), porém a justiça imputada é chamada “justificação de vida” (Romanos 5:18). Uma vê ao crente como  completamente  pecador,  a  outra  como completamente  justo.  O  perdão  é  a remissão do castigo, a justificação é a declaração de que não existe fundamente para impor castigo. O perdão pode ser repetido até setenta vezes sete, a justificação é de uma vez para sempre.

Do  que  se  disse  no  último  parágrafo,  podemos  ver  que  é  um  sério  erro  limitar  a justificação ao mero perdão de pecados. Assim como a “condenação” não é a execução do castigo, porém mais bem a declaração formal de que o acusado é culpado e digno de castigo; assim a “justificação” não é meramente a remissão do castigo, mas o anúncio judicial  de  que  o  castigo  não  pode  ser  aplicado com  justiça  -  sendo  o  acusado plenamente  conformado  a  todos  os  requerimentos  positivos  da lei  como  resultado  da perfeita  obediência  de  Cristo,  que  tem  sido  legalmente  posta  em  sua conta.  A justificação  de  um  crente  não  é  outra  coisa  que  sua  admissão  à  participação  na recompensa  merecida  por  seu  Fiador.  A  justificação  é  nada  mais  nada  menos  que  a justiça  de Cristo  sendo  imputada  a  nós:  a  benção  negativa  que  dalí  emana  é  a  não inculpação de pecados; a positiva, um direito à herança celestial.

Belamente tem isto sido assinalado que “Não podemos separar do Emanuel Sua própria essencial excelência.  Podemos  vê-LO  ferido  e  oferecido  como  incenso  batido  para  o fogo,  porém  foi alguma  vez  o  incenso  queimando  sem  fragância,  e  sendo  somente  a fragância o resultado? O nome de Cristo não somente anula o pecado, este provê no lugar daquele que foi anulado, sua própria excelência eterna. Não podemos somente ter seu poder nulificante; o outro é o seguro acompanhante. Assim era com cada sacrifício típico da Lei. Este era batido: porém como sendo sem defeito era queimado sobre o altar para um odor fragante. O odor ascendia como um memorial diante de Deus: este era aceito  por  Ele,  e  seu  valor  era  atribuído  ou  imputado  a  quem  havia  trazido  a  vítima substituída. Se portanto, recusamos a imputação de justiça, recusamos o sacrifício como é revelado nas Escrituras; já que as Escrituras não conhecem de sacrifício cuja eficácia seja  tão  esgotada  na eliminação  da  culpa  como  para  não  deixar  nada  que  possa  ser apresentado em aceitabilidade diante de Deus” (B. W. Newton).

“O que é colocar nossa justiça na obediência de Cristo, senão que sustentar que somos considerados justos  somente  porque  Sua  obediência  é  aceita  por  nós  como  se  fosse nossa própria ? Pela qual Ambrósio me parece que exemplificou mui belamente esta justiça na benção de Jacó: assim como ele, que não tinha por sua própria conta direito aos privilégios da primogenitura, estando dissimulado com os costumes de seu irmão, e vestido com suas roupas, que espalharam um perfume mui excelente, o levaram a obter o favor de seu pai, de forma que pôde receber a benção para seu próprio proveito, sob o caráter de outro; desse modo nos resguardemos debaixo da preciosa pureza de Cristo” (João Calvino).

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FONTE: Monergismo.com
CAPÍTULO 1 do livro-ebook, "A Doutrina da Justificação" - Arthur W. Pink
TRADUÇÃO: Felipe Sabino de Araújo Neto

Reforma Radical

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