Lucas 23:34
O HOMEM HAVIA FEITO O SEU PIOR. Aquele por quem o mundo foi feito veio ao mundo, mas o mundo não o conheceu. O Senhor da glória tinha tabernaculado entre os homens, mas não foi desejado. Os olhos que o pecado tinha cegado não viram nele nenhuma beleza alguma pela qual ele pudesse ser desejado . Em seu nascimento não havia nenhum quarto na hospedaria, o que prenunciava o tratamento que receberia das mãos dos homens. Pouco tempo após seu nascimento, Herodes procurou matá-lo, e isso sugeria a hostilidade que sua pessoa evocava e predizia a cruz como o clímax da inimizade do homem. Repetidas vezes seus inimigos tentaram sua destruição. E agora os vis desejos deles fora-lhes concedidos. O Filho de Deus tinha se rendido nas mãos deles. Um arremedo de julgamento havia acontecido e, embora seus juízes não tenham encontrado nenhuma falta nele, todavia, eles se rederam ao clamor insistente daqueles que o odiavam à medida que eles repetidamente clamavam: “Crucifica-o”.
Uma ação bárbara tinha sido feita. Nenhuma morte ordinária satisfaria seus inimigos implacáveis. Foi decidida uma morte de sofrimento e vergonha intensas. Uma cruz tinha sido assegurada: o Salvador seria pregado nela. E ali ele foi pendurado — em silêncio. Mas nesse instante seus lábios pálidos são vistos se mexendo — ele está clamando por piedade? Não. O que então? Ele está pronunciado maldição sobre aqueles que estão lhe crucificando? Não. Ele está orando, orando pelos seus inimigos — “E dizia Jesus: Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (Lucas 23.34).
Essa primeira das sete palavras na cruz do nosso Senhor o apresenta em atitude de oração. Quão significante! Quão instrutivo! Seu ministério público tinha sido aberto com oração (Lucas 3.21), e aqui vemos ele sendo fechado com oração. Certamente ele nos deixou um exemplo! Não mais aquelas mãos ministrariam ao doente, pois estavam pregadas no madeiro cruel; não mais aqueles pés poderiam levá-lo nas tarefas de misericórdia, pois estavam presas no madeiro cruel; não mais ele poderia se ocupar na instrução dos apóstolos, pois eles tinham-no esquecido e fugido. Como então ele se ocupou? No ministério da oração! Que lição para nós.
Talvez essas linhas possam ser lidas por alguém que, por razão da idade e doença, não é mais capaz de trabalhar ativamente na vinha do Senhor. Possivelmente nos dias de outrora você era um professor, um pregador, um professor de escola dominical, um distribuidor de panfletos: mas agora você está de cama. Sim, mas você ainda está aqui na terra! Quem sabe Deus não está deixando você aqui mais uns poucos dias para te engajar no ministério da oração — e talvez realizar mais através disso que por todo seu ministério passado ativo. Se você for tentado a depreciar tal ministério, lembre-se do seu Salvador. Ele orou, orou por outros, orou por pecadores, até mesmo em suas últimas horas.
Ao orar por seus inimigos, Cristo não somente colocou diante de nós um exemplo perfeito de como devemos tratar aqueles que nos prejudicam e nos odeiam, mas ele também nos ensinou a nunca considerar algo como além do alcance da oração. Se Cristo orou por seus assassinos, então certamente temos encorajamento para orar agora pelo maior de todos os pecadores! Leitor cristão, nunca perca a esperança. Parece para você um desperdício de tempo continuar orando por aquele homem, por aquela mulher, por aquele seu filho obstinado? O caso deles parece se tornar mais sem esperança a cada dia? Parece como se eles estivem além do alcance da misericórdia divina? Talvez alguém por quem você tem orado por tanto tempo foi enlaçado por uma das seitas satânicas de hoje, ou ele pode ser agora um infiel declarado e desbragado; em resumo, um inimigo aberto de Cristo. Lembre-se então da cruz. Cristo orou por seus inimigos. Aprenda então a não olhar para nada como estando além do alcance da oração.
Um outro pensamento concernente a essa oração de Cristo. Devemos mostrar aqui a eficácia da ração. Essa intercessão de Cristo na cruz por seus inimigos recebeu uma resposta marcada e definida.
A resposta é vista na conversão das três mil amas no dia de Pentecoste. Eu baseio essa conclusão em Atos 3.17, onde o apostolo Pedro diz: “E agora, irmãos, eu sei que o fizestes por ignorância, como também os vossos príncipes”.
Deve ser notado que Pedro usa a palavra “ignorância”, que corresponde ao “não sabem o que fazem” do nosso Senhor. Eis aí a explicação divina dos 3.000 conversos com um simples sermão. Não foi a eloquência de Pedro a causa, mas a oração do Senhor. E, leitor cristão, o mesmo é verdadeiro para nós.
Cristo orou por você e por mim antes de crermos nele. Volte-se para João 17.20 para conferir. “Eu não rogo somente por estes (os apóstolos), mas também por aqueles que, pela sua palavra, hão de crer em mim” (João 17.20). Uma vez mais beneficiemo-nos do exemplo perfeito. Façamos intercessão
também pelos inimigos de Deus e, se orarmos com fé, também será eficaz para a
salvação dos pecadores perdidos.
Para ir diretamente ao nosso texto agora:
“E dizia Jesus: Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”.
1. Aqui vemos o cumprimento da palavra profética.
Quanto Deus fez conhecido de antemão do que deveria suceder naquele dia dos dias! Que retrato completo o Espírito Santo fornece da Paixão do nosso Senhor com todas as circunstâncias que a acompanharam! Entre outras coisas, foi predito que o Salvador deveria “interceder pelos transgressores” (Isaías 53:12, Tradução do Novo Mundo). Isso não tem referência com o ministério presente de Cristo à direita de Deus. É verdade que ele “pode também salvar perfeitamente os que por ele se chegam a Deus, vivendo sempre para interceder por eles” (Hebreus 7.25), mas isso fala do que ele está fazendo agora por aqueles que creem nele, enquanto Isaías 53.12 faz referência ao seu ato gracioso no momento da sua crucificação. Observe que sua intercessão pelos transgressores está conectada com “e foi contado com os transgressores; mas ele levou sobre si o pecado de muitos e fez intercessão pelos transgressores”.
Que Cristo deveria fazer intercessão pelos seus inimigos era um dos itens da maravilhosa profecia encontrada em Isaías 53. Esse capítulo nos diz pelo menos dez coisas sobre a humilhação e o sofrimento do Redentor. Lá, é declarado que ele deveria ser desprezado e rejeitado pelos homens; que deveria ser um homem de dores e que sabia o que era sofrer; que ele deveria ser ferido, moído e castigado; que deveria ser levado, sem resistência, ao matadouro; que deveria permanecer mudo perante os seus tosquiadores; que deveria não somente sofrer nas mãos de homens, mas também ser moído pelo Senhor; que deveria derramar sua alma na morte; que deveria ser enterrado na sepultura de um homem rico; e então foi adicionado que deveria ser contado com os transgressores; e finalmente, que deveria fazer intercessão por esses. Aqui então estava a profecia - “e fez intercessão pelos transgressores”; houve o cumprimento dela - “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”. Ele pensou nos seus assassinos. Ele implorou por aqueles que lhe crucificaram; ele fez intercessão pelo perdão deles.
“E dizia Jesus: Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”.
2. Aqui vemos Cristo identificado com o seu povo.
“Pai, perdoa-lhes”. Em nenhuma ocasião anterior Cristo fez tal pedido ao Pai. Nunca antes ele tinha invocado o perdão dos outros ao Pai. Até aqui ele mesmo perdoou. Ao homem paralítico, ele disse: “Filho, tem bom ânimo; perdoados te são os teus pecados” (Mt 9.2). À mulher que lavou seus pés com suas lágrimas, na casa de Simão, ele disse: “Os teus pecados te são perdoados” (Lc 7.48). Por que, então, ele agora pediu ao Pai para perdoar, ao invés dele mesmo pronunciar diretamente o perdão?
Perdão de pecado é uma prerrogativa divina. Os escribas judeus estavam certos quando arrazoaram: “Quem pode perdoar pecados, senão Deus?” (Mc 2.7). Mas dirá você: Cristo era Deus. Com toda certeza; mas homem também - o Deus-homem. Ele era o Filho de Deus que tinha se tornado o Filho do Homem com o expresso propósito de oferecer a si mesmo como sacrifício pelo pecado. E quando o Senhor Jesus clamou “Pai, perdoa-lhes”, ele estava sobre a cruz, e ali ele não poderia exercer suas prerrogativas divinas. Repare cuidadosamente suas palavras, e então contemple a exatidão maravilhosa da Escritura. Ele tinha dito: “O Filho do Homem tem na terra autoridade para perdoar pecados” (Mt 9.6). Mas ele não estava mais sobre a terra! Ele tinha sido “levantado da terra” (Jo 12.32)! Além do mais, na cruz ele estava agindo como nosso substituto; o justo estava para morrer pelos injustos. Por conseguinte, ao ser suspenso como nosso representante, ele não estava mais no lugar de autoridade onde poderia exercer suas prerrogativas divinas, e, portanto, toma a posição de um suplicante perante o Pai. Assim, dizemos que quando o bendito Senhor Jesus clamou, “Pai, perdoa-lhes”, o vemos absolutamente identificado com o seu povo. Não estava mais na posição de autoridade sobre a “terra”, onde ele tinha o “poder” ou “direito” de perdoar pecados; ao invés disso, ele intercede pelos pecadores - como nós devemos fazer.
“E dizia Jesus: Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”.
3. Aqui vemos a avaliação divina do pecado e sua culpa conseqüente.
Sob a economia levítica, Deus exigiu que a expiação devesse ser feita pelos pecados praticados por ignorância.
“Quando alguma pessoa cometer uma transgressão e pecar por ignorância nas coisas sagradas do SENHOR, então, trará ao SENHOR, por expiação, um carneiro sem mancha do rebanho, conforme a tua estimação em siclos de prata, segundo o siclo do santuário, para expiação da culpa. Assim, restituirá o que ele tirou das coisas sagradas, e ainda de mais acrescentará o seu quinto, e o dará ao sacerdote; assim, o sacerdote, com o carneiro da expiação, fará expiação por ela, e ser-lhe-á perdoado o pecado”. (Lv 5.15, 16).
E lemos novamente:
”Quando errardes e não cumprirdes todos estes mandamentos que o SENHOR falou a Moisés, sim, tudo quanto o SENHOR vos tem mandado por Moisés, desde o dia em que o SENHOR ordenou e daí em diante, nas vossas gerações, será que, quando se fizer alguma coisa por ignorância e for encoberta aos olhos da congregação, toda a congregação oferecerá um novilho, para holocausto de aroma agradável ao SENHOR, com a sua oferta de manjares e libação, segundo o rito, e um bode, para oferta pelo pecado. O sacerdote fará expiação por toda a congregação dos filhos de Israel, e lhes será perdoado, porquanto foi erro, e trouxeram a sua oferta, oferta queimada ao SENHOR, e a sua oferta pelo pecado perante o SENHOR, por causa do seu erro”. (Nm 15. 22-25, ARA).
É em vista de passagens tais como essas que encontramos Davi orando: “Expurga-me tu dos [erros] que me são ocultos” (Sl 19.12).
O pecado é sempre pecado aos olhos divinos, quer estejamos consciente dele ou não. Pecados cometidos por ignorância precisam de expiação tanto quanto os conscientes. Deus é santo, e ele não rebaixará seu padrão de justiça ao nível da nossa ignorância. Ignorância não é inocência. Na verdade, ignorância é mais culpada agora do que na época de Moisés. Nós não temos desculpas pela nossa ignorância. Deus tem revelado clara e plenamente sua vontade. A Bíblia está em nossas mãos, e não podemos alegar ignorância de seu conteúdo, exceto para condenar-nos por nossa preguiça. Ele tem falado, e por sua palavra seremos julgados.
E, todavia, permanece o fato de que somos ignorantes de muitas coisas, e o erro e a culpa são nossos. E isso não minimiza a enormidade do nosso delito. Pecados cometidos por ignorância precisam do perdão divino, assim como a oração do Senhor nos mostra claramente aqui. Aprenda, então, quão alto é o padrão de Deus, quão grande é a nossa necessidade, e louve-o por uma expiação de suficiência infinita, que limpa de todo pecado.
“E dizia Jesus: Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”.
4. Aqui vemos a cegueira do coração humano.
“Porque não sabem o que fazem”. Isso não significa que os inimigos de Cristo eram ignorantes do fato de sua crucificação. Eles sabiam perfeitamente que tinham clamado: “Crucifica-o”. Eles sabiam perfeitamente que o seu vil pedido lhes tinha sido concedido por Pilatos. Eles sabiam perfeitamente que ele tinha sido pregado na cruz, pois eram testemunhas oculares do crime. O que, então, o Senhor quis dizer quando disse: “Porque não sabem o que fazem”? Ele quis dizer que eles eram ignorantes da grandeza do seu crime. Eles não sabiam que era o Senhor da glória que eles estavam crucificando. A ênfase não é sobre “porque não sabem”, mas sobre “porque não sabem o que fazem”.
E, todavia, eles deveriam ter sabido. A cegueira deles era inescusável. As profecias do Antigo Testamento que tinham recebido seu cumprimento nele eram suficientemente claras para identificá-lo como o Santo de Deus. Seu ensino era singular, pois seus próprios críticos foram forçados a admitir: “Nunca homem algum falou assim como este homem” (Jo 7.46). E o que dizer da sua vida perfeita?
Ele viveu diante dos homens uma vida que nunca tinha sido vivida sobre a terra antes. Ele não agradava a si mesmo. Ele se ocupava de fazer o bem. Ele estava sempre à disposição dos outros. Não havia egoísmo nele. Sua vida foi de auto-sacrifício do princípio ao fim. Sua vida foi sempre vivida para a glória de Deus. Sobre sua vida estava estampada a aprovação do céu, pois a voz do Pai testificou audivelmente: “Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo”. Não, não havia escusa alguma para a ignorância deles. Isso apenas demonstrava a cegueira dos seus corações. A rejeição do Filho de Deus por parte deles trouxe pleno testemunho, de uma vez por todas, de que a mente carnal é “inimizade contra Deus” (Rm 8.7).
Quão triste é pensar que essa terrível tragédia ainda está sendo repetida! Pecador, você faz pouca ideia do que está fazendo ao negligenciar a grande salvação de Deus. Você faz pouca ideia de quão terrível é o pecado de menosprezar o Cristo de Deus e repelir os convites de sua misericórdia. Você faz pouca ideia da profunda culpa que está unida ao seu ato de recusar receber o único que pode te salvar dos seus pecados. Você faz pouca ideia de quão medonho é o crime de dizer: “Não queremos que este reine sobre nós”. Você faz pouca ideia do que faz. Você considera essa questão vital com indiferença total. A questão se apresenta hoje da mesma forma como dantes: “Que farei, então, de Jesus, chamado Cristo?”. Pois você tem que fazer algo com ele: ou o despreza e rejeita, ou o recebe como o Salvador de sua alma e o Senhor da sua vida. Mas, digo novamente, isso lhe parece um assunto de diminuta urgência, de pequena importância. Por anos você tem resistido aos esforços do seu Espírito. Por anos você tem posto de lado essa importantíssima consideração. Por anos você tem endurecido seu coração contra ele, tampado seus ouvidos aos seus apelos, e fechado seus olhos à sua excelsa beleza. Ah! você não sabe O QUE faz. Você está cego em sua loucura. Cego para o seu terrível pecado. Todavia, você não está sem escusa. Você pode ser salvo agora se quiser.
“Crê no Senhor Jesus Cristo e [tu] serás salvo”. Ó, venha ao Salvador agora e diga com alguém de outrora, “Mestre, que eu tenha vista”.
“E dizia Jesus: Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”.
5. Aqui vemos uma exemplificação amorosa do seu próprio ensino.
No Sermão do Monte nosso Senhor ensinou aos seus discípulos: “Amai a vossos inimigos, bendizei os que vos maldizem, fazei bem aos que vos odeiam e orai pelos que vos maltratam e vos perseguem” (Mt 5.44). Acima de todos os outros, Cristo praticou o que ele pregou. A graça e a verdade vieram através de Jesus Cristo. Ele não somente ensinou a verdade, mas ele mesmo era a verdade encarnada. Ele disse: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida” (Jo 14.6). Assim, aqui sobre a cruz ele exemplificou perfeitamente seu ensino do monte. Em todas as coisas ele nos deixou um exemplo.
Observe que Cristo não perdoou pessoalmente seus inimigos. Assim, em Mt 5.44 ele não exortou seus discípulos a perdoarem seus inimigos, mas os exortou a “orar” por eles. Mas nós não devemos perdoar aqueles que nos maltratam? Isso nos leva a um ponto com respeito ao qual é necessária muita instrução hoje em dia.
A escritura ensina que sob todas as circunstâncias devemos perdoar sempre? Eu respondo enfaticamente: não, ela não ensina. A palavra de Deus diz: “Se teu irmão pecar contra ti, repreende-o; e, se ele se arrepender, perdoa-lhe; e, se pecar contra ti sete vezes no dia e sete vezes no dia vier ter contigo, dizendo: Arrependo-me, perdoa-lhe” (Lc 17.3,4). Aqui somos claramente ensinados que uma condição deve ser satisfeita pelo ofensor antes que possamos pronunciar o perdão. Aquele que nos ofendeu deve primeiramente “se arrepender”, isto é, julgar a si mesmo por seu erro e dar evidência de sua tristeza por causa dele. Mas, suponha que o ofensor não se arrependa? Então eu não preciso perdoá-lo.
Mas que não haja má compreensão do que queremos dizer aqui. Mesmo que alguém que nos ofendeu não se arrependa, todavia, eu não devo abrigar sentimentos ruins contra ele.
Não deve haver nenhum ódio ou malícia cultivada no coração. Todavia, por outro lado, eu não devo tratar o ofensor como se ele não tivesse cometido nenhum erro. Isso seria fechar os olhos à ofensa, e, portanto, eu estaria falhando em manter as exigências da justiça, e isso é o que o crente deve fazer sempre. Deus alguma vez perdoa onde não há arrependimento? Não, pois a escritura declara: “Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça” (1 Jo 1.9). Mais uma coisa. Se alguém me prejudicar e não se arrepender, embora eu não possa lhe perdoar e tratá-lo como se ele não tivesse me ofendido, todavia, eu não apenas não devo
abrigar nenhuma malícia em meu coração contra ele, mas devo também orar por ele.
Aqui está o valor do exemplo perfeito de Cristo. Se não podemos perdoar, podemos orar
a Deus para perdoá-lo.
“E dizia Jesus: Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”.
6. Aqui vemos a grande e primária necessidade do homem.
A primeira lição importante que todos precisam aprender é que somos pecadores, e como tais, inaptos para a presença de um Deus Santo. É em vão que escolhemos nobres ideais, adotamos boas resoluções, e aceitamos excelentes regras pelas quais viver, até que a questão do pecado tenha sido resolvida. Não é de proveito algum tentar desenvolver um belo caráter e ter por objetivo obter a aprovação de Deus, enquanto há pecado entre ele e as nossas almas. Qual a utilidade dos sapatos, se os nossos pés estão paralisados? De que utilidade são os óculos, se somos cegos? A questão do perdão dos meus pecados é básica, fundamental e vital. Não importa se sou altamente respeitado por um círculo amplo de amigos, se ainda estou em meus pecados. Não importa se eu sou honesto em meu negócio, se ainda sou um transgressor não perdoado aos olhos de Deus. O que importará na hora da morte será: Os meus pecados foram expurgados pelo sangue de Cristo?
A segunda lição importantíssima que precisamos aprender é como o perdão dos pecados pode ser obtido. Qual é fundamento sobre o qual um Deus santo perdoará pecados? E aqui é importante observar que há uma diferença vital entre o perdão divino e muito do perdão humano. Como regra geral, o perdão humano é uma questão de complacência, frequentemente de frouxidão. Queremos dizer que o perdão é mostrado à custa da justiça e da retidão. Na corte humana da lei, o juiz tem que escolher entre duas alternativas: quando se prova que alguém no banco dos réus é culpado, o juiz deve aplicar a penalidade da lei, ou deve negligenciar os requerimentos da lei - uma é justiça, a outra é misericórdia. A única forma possível na qual o juiz pode tanto aplicar os requerimentos da lei e ainda mostrar misericórdia ao ofensor, é uma terceira parte oferecer sofrer em sua própria pessoa a penalidade que o condenado merece. Assim aconteceu no conselho divino. Deus não exerceria misericórdia à custa da justiça. Ele, como o juiz de toda a terra, não colocaria de lado as demandas da sua santa lei. Todavia, Deus mostraria misericórdia. Como? Através de um que satisfaria plenamente sua lei violada. Por intermédio de seu próprio Filho, tomando o lugar de todos aqueles que creem nele e carregando seus pecados em seu próprio corpo no madeiro. Deus poderia ser justo e ainda misericordioso, misericordioso e ainda justo. Foi assim para que a “graça reinasse pela justiça”.
Um fundamento justo tinha sido fornecido sobre o qual Deus poderia ser justo e ainda o justificador de todo aquele que crê. Por conseguinte, somos informados:
“E disse-lhes: Assim está escrito, e assim convinha que o Cristo padecesse e, ao terceiro dia, ressuscitasse dos mortos; e, em seu nome, se pregasse o arrependimento e a remissão (perdão) dos pecados, em todas as nações, começando por Jerusalém” (Lc 24.46,47).
E novamente:
“Seja-vos, pois, notório, varões irmãos, que por este se vos anuncia a remissão dos pecados. E de tudo o que, pela lei de Moisés, não pudestes ser justificados, por ele é justificado todo aquele que crê” (At 13.38, 39).
Foi em virtude do sangue que ele estava derramando que o Salvador clamou: “Pai, perdoa-lhes”. Foi m virtude do sacrifício expiatório que ele estava oferecendo que pôde ser dito que “sem derramamento de sangue não há remissão”.
Ao orar pelo perdão dos seus inimigos, Cristo foi diretamente na raiz da necessidade deles. E a necessidade deles é a necessidade de todo filho de Adão. Leitor, você tem os seus pecados perdoados, isto é, remidos ou levados embora? Você é, pela graça, um daqueles de quem é dito: “Em quem temos a redenção pelo seu sangue, a saber, a remissão dos pecados” (Cl 1.14)?
“Então disse Jesus: Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”.
7. Aqui vemos o triunfo do amor redentor.
Note atentamente a palavra com a qual nosso texto começa. “Então”. O versículo que imediatamente o precede é lido assim: “E, quando chegaram ao lugar chamado a Caveira, ali o crucificaram e aos malfeitores, um, à direita, e outro, à esquerda”. Então, disse Jesus, Pai, perdoa-lhes. “Então” – quando o homem tinha feito o seu pior. “Então” - quando a vileza do coração humano foi demonstrada em maldade diabólica e climatérica. “Então” - quando com mãos ímpias a criatura ousou crucificar o Senhor da glória. Ele poderia ter expressado maldições terríveis sobre eles. Ele poderia ter lançado os raios da justa ira e os matado. Ele poderia ter feito a terra abrir a sua boca, de forma que eles caíssem vivos no abismo. Mas não. Embora sujeito à vergonha indizível, embora sofrendo dor excruciante, embora desprezado, rejeitado, odiado; todavia, ele clamou: “Pai, perdoa-lhes”. Esse era o triunfo do amor redentor. “O amor é paciente, é benigno... tudo sofre... tudo suporta” (1Co 13, ARA). Assim foi demonstrado na cruz.
Quando Sansão chegou na hora da sua morte, ele usou a grande força do seu corpo para abarcar a destruição de seus antagonistas; mas aquele que era perfeito exibiu a força de seu amor orando pelo perdão dos seus inimigos. Graça inigualável! “Inigualável”, dizemos, pois nem mesmo Estevão conseguiu seguir plenamente o exemplo bendito dado pelo Salvador. Se o leitor se voltar para Atos 7, descobrirá que o primeiro pensamento de Estevão foi sobre si mesmo, e depois foi que orou pelos seus inimigos - “E apedrejaram a Estêvão, que em invocação dizia: Senhor Jesus, recebe o meu espírito.
E, pondo-se de joelhos, clamou com grande voz: Senhor, não lhes imputes este pecado. E, tendo dito isto, adormeceu” (At 7.59,60). Mas com Cristo a ordem foi inversa: ele orou primeiro pelos seus adversários, e no final por si mesmo. Em todas as coisas ele tem a preeminência.
E agora, concluindo com uma palavra de aplicação e exortação. Se esse capítulo estiver sendo lido por uma pessoa não-salva, pedir-lhe-emos seriamente ponderar bem a próxima sentença - Quão terrível deve ser se opor a Cristo e à sua verdade conscientemente! Aqueles que crucificaram o Salvador não sabiam o que estavam fazendo. Mas, meu leitor, há um sentido muito real e solene no qual isso é verdade com respeito a você também. Você sabe que deve receber a Cristo como seu Salvador, que deve coroá-lo como Senhor de sua vida, que deve tornar a sua primeira e última preocupação agradá-lo e glorificá-lo. Fique então avisado; seu perigo é grande. Se você deliberadamente dá as costas a ele, dá as costas ao único que pode salvá-lo dos seus pecados, e está escrito: “Porque, se pecarmos voluntariamente, depois de termos recebido o conhecimento da verdade, já não resta mais sacrifício pelos pecados, mas uma certa expectação horrível de juízo e ardor de fogo, que há de devorar os adversários” (Hb 10.26,27).
Resta-nos apenas adicionar uma palavra sobre a bendita inteireza do perdão divino.
Muitos dentre o povo de Deus ficam intranquilos e perturbados sobre esse ponto. Eles entendem como é que todos os pecados que cometeram antes de receberem a Cristo como seu Salvador foram perdoados, mas amiúde não estão livres de dúvidas com respeito aos pecados que cometem após terem nascido de novo. Muitos supõem que é possível para eles pecar de uma forma que lhes coloque além do perdão que Deus lhes concedeu. Supõem que o sangue de Cristo trata somente com o passado deles, e que até onde diz respeito ao presente e ao futuro, eles tem que se cuidar por si mesmos. Mas de que valor seria um perdão que pode ser tirado de mim a qualquer momento? Certamente não pode haver nenhuma paz estabelecida quando minha aceitação para com Deus e a minha ida ao céu é feita dependente do meu agarrar-se a Cristo, ou da minha obediência e fidelidade.
Bendito seja Deus, o perdão que ele concede cobre todos os pecados - passados, presentes e futuros. Amigo crente, Cristo não carregou os “seus” pecados em seu próprio corpo no madeiro? E os seus pecados não eram todos futuros, quando ele morreu? Certamente, pois naquele tempo você não tinha nascido, e não tinha cometido nenhum pecado sequer. Muito bem então: Cristo verdadeiramente levou os seus pecados “futuros” tanto quanto os seus pecados passados. O que a palavra de Deus ensina é que a alma incrédula é tirada do lugar sem perdão para onde esse está ligado.
Os cristãos são um povo perdoado. Diz o Espírito Santo: “Bem-aventurado o homem a quem o Senhor não imputa o pecado” (Rm 4.8). O crente está em Cristo, e ali o pecado nunca nos será imputado novamente. Esse é o nosso lugar ou posição diante de Deus.
Em Cristo é onde ele nos contempla. E porque estou em Cristo, estou completa e eternamente perdoado; tão perdoado que o pecado nunca será mais será posto sobre mim como acusação no que toca à minha salvação, mesmo que eu permanecesse na terra por mais cem anos. Eu estou fora do alcance para sempre. Ouça o testemunho da escritura: “E, quando vós estáveis mortos nos pecados e na incircuncisão da vossa carne, (Deus) vos vivificou juntamente com ele (Cristo), perdoando-vos todas as ofensas” (Cl 2.13). Observe as duas coisas que são aqui unidas (e o que Deus ajuntou, não o separe o homem!) - minha união com um Cristo ressurreto é conectada com o meu perdão! Se então minha vida está “oculta com Cristo em Deus” (Cl 3.3), então eu estou fora para sempre do lugar onde a imputação do pecado é aplicada. Por conseguinte, está escrito: “Portanto, agora, nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus” (Rm 8.1) - como poderia existir, se “todas as ofensas” foram perdoadas? Ninguém pode lançar nenhuma acusação contra os eleitos de Deus (Rm 8.33). Leitor cristão, junte-se ao escritor em louvor a Deus, pois nós somos eternamente perdoados de tudo.
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Retirado do e-book: "OS SETE BRADOS DO SALVADOR
SOBRE A CRUZ. ARTHUR W. PINK"
Traduzido do original em inglês
The Seven Sayings of the Saviour on the Cross (1919)
Tradução: Vanderson Moura da Silva
Créditos: Monergismo.com
Que texto abençoado!!!!
ResponderExcluirÉ verdade, e eu sempre fico maravilhadamente feliz quando penso que Jesus morreu por mim e que Deus desejou meu nascimento. Pois séculos após Jesus morrer por mim, Deus me formou no ventre materno e desde lá já havia me escolhido como povo exclusivo dEle. Isso não é maravilhoso? Sermos salvos sabendo que Ele sempre nos amou?
Que todas as pessoas consigam entender esse milagre, por que só assim é possível viver feliz de verdade enquanto em vida.